domingo, 16 de dezembro de 2007

Entre a Matéria e o Espírito




Como universitário, percebo que é um tanto difícil encontrar uma disciplina sobre fantasmas na grade de disciplinas de algum curso ou entre as disciplinas facultativas. Igualmente raro são cursos com títulos do tipo “Poderes Psíquicos II” ou “Formas Alienígenas de Vida”. De fato, parece não ser incentivado nenhum tipo de estudo acerca de qualquer fenômeno paranormal. Por que o meio acadêmico é tão relutante em aceitar esse inegável e cada vez mais freqüente aspecto da realidade? Talvez por pensarem que só há duas maneiras de se entender tais coisas como fantasmas: Ou eles simplesmente não existem e são produto da fantasia, alucinação e erro do homem; ou eles existem e são completamente diferentes de qualquer coisa que conheçamos e entendamos e, portanto, são um completo mistério. Nenhuma das duas visões deixa muito espaço para pesquisas acadêmicas ou instruções a nível universitário. Tal falta de movimentação talvez tenha a ver com como entendemos a mente.
Desde o tempo de Descartes, a filosofia ocidental vem se complicando com o que se chama de “problema corpo-mente”. A mente seria meramente uma propriedade emergente do corpo físico destituída de existência independente, como muitos filósofos modernos defendem? Ou a mente seria algo completamente diferente da matéria, como os Cartesianos (seguidores de Descartes) querem que acreditemos? Para aqueles que vêm a mente como idêntica à matéria, a experiência da consciência deve ser aceita como uma espécie de ilusão e desprezada enquanto objeto de estudo científico. Por outro lado, para aqueles que subscrevem à segunda visão (conhecida como dualismo Cartesiano), a mente certamente existe, mas é mais ou menos incompreensível. Enquanto que as atividades do corpo agem conforme as leis da física, a mente é aparentemente livre de tais leis. Independente de suas diferenças, ambas as visões situam a mente acima da investigação e da compreensão prática. E, por fim, nenhuma delas é satisfatória intelectualmente ou elegante ao meio acadêmico.
A literatura Védica da antiga Índia apresenta uma terceira alternativa. Sri Krsna, no Bhagavad-gita, explica a Seu amigo Arjuna que a mente, a inteligência e o falso ego são três de Suas oito energias materiais que, juntas, compõem o corpo sutil; enquanto que Suas outras cinco energias matérias (terra, água, ar, fogo e éter) compõem o corpo grosseiro, ou físico. Esse conceito de “corpo sutil” como a combinação da mente, inteligência e falso ego é o equivalente Védico para a “mente” da filosofia ocidental. Entendida dessa plataforma, a mente não é nem completamente transcendental as leis que governam a matéria, nem é sujeita as mesmas leis a que se sujeita o corpo grosseiro. Em outras palavras, as atividades da mente podem ser mensuradas e previstas, mas os cientistas modernos não têm nem as ferramentas nem o conhecimento teórico para tal.
Então, temos aqui três maneiras de se conceber a mente: como completamente idêntica à matéria (Modelo Moderno), como completamente oposta à matéria (Modelo Cartesiano), e como matéria sutil entre a matéria grosseria e a energia espiritual pura (Modelo Védico).
Outra forma de entender a diferença entre esses três modelos é observar a quem eles apontam como o eu. O Modelo Moderno indica o corpo em si como o eu, sem nenhuma entidade independente ou superior. O Modelo Cartesiano indica a mente como o eu, sendo o corpo um veículo. O Modelo Védico indica o eu como uma entidade completamente espiritual, que ocupa temporariamente tanto um corpo sutil quanto um grosseiro. O Modelo Védico abre possibilidades para a pesquisa e estudo do reino sutil, o que não é possível tomando por base um dos outros dois modelos. Vejamos como seria isso.
Poderes Psíquicos
O estudo de habilidades psíquicas, tais como a habilidade de se ler mentes (telepatia) ou a de se mover objetos com a mente (telecinesia), é atualmente marginalizado no âmbito acadêmico. E isso não é surpreendente. Dentro das possíveis escolhas atuais, podemos ou seguir o Modelo Moderno e simplesmente negar a existência de poderes psíquicos, ou podemos seguir o Modelo Cartesiano e aceitar a existência de tais habilidades, mas sem podermos explicá-las, restando-nos apenas dar a elas o tratamento de “milagres”. Se seguirmos o Modelo Védico, todavia, e entendermos a mente simplesmente como outro tipo de matéria, podemos, ao menos, aceitar em teoria que tais interações entre a mente e o reino físico são possíveis. O que restaria seria experimentar e determinar quais tipos de leis regulam a mente (o corpo sutil), e como elas diferem das leis que afetam o corpo grosseiro. A literatura Védica certamente pode ajudar tal pesquisa fornecendo rica estrutura teorética.
Fantasmas
Se a mente é apenas outro tipo de corpo através do qual uma pessoa pode agir, seria possível que algumas pessoas tivessem apenas esse tipo de corpo, sem sua contraparte física? É exatamente assim que a literatura da antiga Índia explica os fantasmas – outro fenômeno que o Modelo Védico da mente pode desmistificar. As leis do Modelo Moderno anulam completamente a possibilidade de existirem fantasmas. Eles não podem ser percebidos pelos meios tradicionais, então eles não existem. O Modelo Cartesiano, como alternativa, reconhece uma realidade intangível acima do corpo, então, em teoria, não haveria problemas em admitir a existência de fantasmas. Na prática, todavia, a idéia de fantasmas permanece acima da investigação racional devido ao fato da realidade intangível a que pertencem não ter nada em comum com a matéria. E, afinal, a matéria é tudo com o que nossos instrumentos e métodos científicos são capazes de lidar. Aqui, novamente, o Modelo Védico abre novas portas. Fantasmas podem ser entendidos como entidades vivas que possuem mente, ou corpo sutil, mas não forma física, ou corpo grosseiro. Tal visão auxilia desfazer a nuvem de medo e mistério que de maneira geral acompanha tais seres vivos. Podemos encontrar conforto no fato de que, longe de serem mágicos ou míticos, fantasmas não são, fundamentalmente, diferentes de você ou de mim. Eles apenas existem em outro estado material que ainda está para ser conhecido pela classe científica.
Seres de Outros Planetas
Se seres exatamente como nós podem existir sem a necessidade de um corpo físico externo que possamos perceber diretamente, poderiam existir outros tipos de seres corporificados acima de nossa percepção sensorial? A literatura Védica responde com um enérgico sim: Os demais planetas do universo são povoados, mas por seres de consciência superior, e corpos coerentemente superiores. O Modelo Moderno atribui a visão de óvnis e de outros seres alienígenas à falsificação de imagens e ao poder de imaginação da mente. O Modelo Cartesiano relega tais seres ao reino angélico.
O Modelo Védico, em contraste, dá suporte a uma abordagem mais positiva e produtiva ao estender o domínio do corpo sutil. Formas sencientes de vida em outros planetas são entendidas como tendo, de acordo com seu status, ou nenhum corpo grosseiro e apenas corpo sutil, ou um corpo grosseiro mais refinado, que exibiria características semelhantes ao nosso corpo sutil. Muitos deles, por exemplo, podem voar ou mudar sua forma à vontade, feitos que só temos acesso em nossos pensamentos e em sonho (o reino da mente/corpo sutil). Contudo, seus corpos também são materiais. Esses seres em corpos mais sofisticados não são isentos, portanto, das limitações que afetam outras entidades materialmente corporificadas, como a morte. Portanto, não há impedimento de que interajam com formas mais grosseiras de matéria (como nossos corpos). Assim, a busca humana por fazer contato com seres de outros planetas não é em vão. Munidos de tal concepção, nossa busca por inteligência extraterrestre precisa apenas dispor de um novo conjunto de instrumentos que vá além da tradicional percepção dos cinco sentidos. Eles estão, sim, lá fora, e podem ser contatados - só é preciso que consideremos com seriedade a literatura Védica e refinemos nosso processo.
Muito Além da Mente
É muito interessante entender o funcionamento da mente com a ajuda do Modelo Védico, mas, talvez perguntem, e quanto à alma? Krsna, após falar dessas Suas oito energias materiais, fala de uma energia Sua que é superior e intocada pelas leis materiais. Tendo aceitado o Modelo Védico de mente, a pessoa certamente desejará também estudar o verdadeiro eu espiritual para entender os corpos materiais temporários. Os Vedas, de fato, instam-nos a estudar exatamente a partir do prisma do verdadeiro eu. Para aqueles prontos para tal estudo definitivo, os Vedas providenciam o conhecimento necessário, bem como os processos práticos. Mas, antes de nossos colegas universitários aderirem disciplina tão ambiciosa, talvez comecem estudando o reino que fica entre o mundo material, que conhecemos tão bem, e a realidade espiritual, que transcende nossa compreensão. Talvez a comunidade científica deva começar sondando essa área sutil da mente e ampliando sua área de investigação para incluir fenômenos como poderes psíquicos, fantasmas e vida em outros planetas. Tal busca traria um conhecimento que poderia ser usado com o fim de aprimorar nossa vida material neste mundo, bem como de nos conduzir ruma à compreensão de nossa vida espiritual muito além desse reino ordinário. Enquanto esse dia não chega, sigo me matriculando nas disciplinas tradicionais… aguardando.

por Navin Jani
Tradução por Bhagavan dasa (DvS)

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