quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

De Onde Caem as Almas Caídas?


Após aprendermos que o mundo material não é nossa verdadeira morada, nós naturalmente nos perguntamos: “Como viemos parar aqui?”.

Srila Prabhupada diz que, como almas, somos todos originalmente conscientes de Krsna. Mas o que isso significa? Estávamos todos originalmente com Krsna no mundo espiritual? E se sim, como poderíamos cair? No Bhagavad-gita, o Senhor Krsna diz: “Uma vez que você alcança o mundo espiritual, você nunca cai”. Então, como poderíamos ter caído de lá, para início de conversa?

Alguns tentam contornar esse problema sugerindo uma idéia diferente: Nós caímos não da morada pessoal de Krsna, mas do brahmajyoti, a refulgência luminosa que emana de tal morada. Como afirmado no Srimad-Bhagavatam, yogis que buscam o aspecto impessoal do Supremo se imergem naquela resplandecente luz – apenas para caírem posteriormente no mundo material. Talvez, então, nós tenhamos caído originalmente do brahmajyoti.

Srila Prabhupada rejeitou tal idéia. Aqueles no brahmajyoti, ele escreveu, não são conscientes de Krsna, então eles também estão caídos. “Assim, não existe tal questão como cair de uma condição caída. Quando se fala em cair, tem-se de cair de uma condição não-caída”.

Bom, então, já que somos chamados de “eternamente condicionados”, eternamente iludidos, talvez nós nunca tenhamos caído – simplesmente sempre estivemos aqui embaixo.

Essa idéia também é rejeitada por Srila Prabhupada. “Eternamente condicionados”, ele explicou, “quer dizer que estivemos caídos por tanto tempo que não é mais possível determinar o momento da queda”.

Srila Bhaktivinoda Thakura, três gerações antes de Srila Prabhupada na linha de instrutores espirituais, colocou o seguinte: “Por favor, evitem a desencaminhadora questão de ‘quando estas jivas [entidades vivas] foram criadas e condicionadas’. O tempo de maya não tem existência na história espiritual, porque ele só tem seu princípio depois do condicionamento das jivas, e não é possível, portanto, empregar a cronologia de maya para assuntos como este”.

“O Relacionamento é Eterno”

Aqui, então, está como Srila Prabhupada descreveu nosso estado original e a maneira com que caímos e o abandonamos.

“Constitucionalmente”, ele disse em uma carta, “toda entidade viva, mesmo que esteja em Vaikunthaloka [a morada espiritual pessoal do Senhor], existe a chance de queda. Por isso a entidade viva é chamada de energia marginal”.

“De maneira geral”, ele explicou, “qualquer um que desenvolva seu relacionamento com Krsna, não cai em nenhuma circunstância, mas, porque a independência está sempre ali, a alma pode cair de sua posição ou de seu relacionamento por mau uso de sua independência”.

Em outra carta, Srila Prabhupada aprofundou um pouco mais o assunto. “Nós sempre estamos com Krsna. Onde Krsna não está presente? [Mas] quando esquecemos esse fato, ficamos realmente muito longe dEle. No Isopanisad, afirma-se claramente que tad dure tad v antike: ‘Ele está muito longe, mas, ao mesmo tempo, muito perto’ (Isopanisad, Mantra Cinco). Assim, esse esquecimento é nossa queda. Ele pode se manifestar a qualquer momento, mas podemos anular tal esquecimento imediatamente elevando-nos à plataforma da consciência de Krsna”.

Nossa relação com Krsna nunca se perde, Srila Prabhupada disse. “Apenas esquecemos dela pela influência de maya. Ela, então, é reobtida, ou revivida, pelo processo de se ouvir o santo nome de Krsna, e, então, o devoto se ocupa no serviço ao Senhor - sua posição original, ou constitucional. A relação da entidade viva com Krsna é eterna, sendo tanto Krsna quanto a entidade viva eternos. O processo é apenas para redespertar; não há nada novo”.

Ainda em outra carta, Srila Prabhupada reitera o mesmo ponto de outra maneira. “Originalmente, somos todos oriundos da plataforma da consciência de Krsna em nossa relação pessoal eterna de amor por Krsna. Mas, devido ao esquecimento, tomamos intimidade com o mundo material, ou maya”. Mas, quando cantamos o mantra Hare Krsna com sinceridade e sem ofensas, nossa consciência de Krsna original é imediatamente revivida. “Naturalmente, então, tudo sobre Krsna é originalmente conhecido por nós, e, tão longo começamos a nos associar com os devotos do Senhor e a cantar Seu santo nome, essa memória gradualmente se restabelece e lembramos nossa posição constitucional de serviço constante e variado a Ele”.

Nossa separação de Krsna, Srila Prabhupada explica, é como um sonho. Nós sonhamos “eu sou este corpo”, e sonhamos com felicidade em relacionamentos materiais. Essa condição de sonho é nosso estado não-liberado. Mas, embora esse estado de sonho pareça durar por muitas vidas, assim que nos tornamos conscientes de Krsna, acordamos, e o sonho desaparece de imediato. “Após milhões e milhões de anos afastados da lila [passatempos] do Senhor, quando uma pessoa se torna consciente de Krsna, esse período se torna insignificante, como se tivesse sido um sonho”.

Não Tente Entender – Tente Ir Embora

Decisivamente, Srila Prabhupada enfatizaria que ficar especulando aridamente sobre quando caímos ou de onde caímos não resolve o nosso problema. “A conclusão é que independente de qual seja o nosso passado, busquemos todos a consciência de Krsna e nos unamos imediatamente a Krsna”.

Novamente: “Deve-se entender estar em uma vida condicionada e tentar se curar disso. [...] O esquecimento de Krsna é a doença; fiquemos todos, portanto, sempre em consciência de Krsna e livremo-nos da doença. Isso é vida saudável.”

E mais uma vez: “Melhor do que buscar explicações sobre como tudo aconteceu para que viéssemos para cá, nossa melhor ocupação é sair dessa cena cantando Hare Krsna constantemente e nos ocupando no transcendental serviço ao Senhor Krsna”.

O conselho é bastante claro. o nosso intelecto insiste, todavia, tentando entender o que não pode ser entendido. Decidimos, então, buscar por vários livros para lermos o que foi dito por outros grandes acaryas (instrutores espirituais) do passado. E o que descobrimos? Diferentes instrutores – todos conscientes de Krsna – parecem expressar diferentes visões. E o que acontece em seguida? Ficamos com a visão de um ou de outro, ou simplesmente ficamos confusos. Nossos circuitos mentais começam a entrar pane.

O mestre espiritual de Srila Prabhupada, Srila Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakura, portanto, dá-nos o seguinte conselho. Devemos evitar, ele diz, “longas especulações empíricas que não têm nenhuma utilidade”, que ele tratou por “falsas e cheias de exímia prolixidade”. Ele nos lembra que “tudo o que o devoto imaculado do Senhor Supremo diz é verdade e é independente de qualquer consideração doentia de prós e contras”.

Quando tais devotos puros discordam, ele diz, há “o elemento de mistério em suas controvérsias verbais”. E “aqueles cujo julgamento é mundano [...] não pode entrar nas espirituais e todo-amorosas controvérsias dos devotos puros”. Por falta de devoção pura, tais pessoas “são hábeis em imputar aos devotos seus próprios defeitos de partidarismo e visões opositoras”. Portanto, ele aconselha que, a qualquer momento que tais disputas sobre os passatempos do Senhor apareçam, devemos lembrar o que foi ensinado pelo Senhor Caitanya Mahaprabhu e Seus associados, os Gosvamis: “que a Verdade Absoluta é sempre caracterizada pela variedade espiritual, que transcende a variedade da manifestação mundana; mas que Ela nunca é destituída de qualidades”.

Discussões Infindáveis: Truque de Maya

O Mahabharata nos traz que não podemos conhecer a verdade meramente por lógica e argumentação (tarko ‘pratishtah). Acintyah khalu ye bhava na tams tarkena yojayet: “Não há nenhuma utilidade em discutir sobre aquilo que é inconcebível”. Afinal, é inconcebível.

Um irmão espiritual de Srila Prabhupada, respeitado por sua profunda realização filosófica, costumava frisar o mesmo ponto, um de seus seguidores nos informou. Sendo repetidas vezes interrogado sobre de onde a entidade viva cai, ele se tornou enfastiado com a pergunta. “Por que vocês sempre perguntam sobre o tópico mais difícil de se entender?”, ele respondeu uma vez. “Por que não tentam entender o tópico mais fácil?”, perguntou se referindo à prática da consciência de Krsna e seu conseqüente retornou ao Supremo.

Devotos puros de Krsna evitam discussões infindáveis. Tais devotos sabem que tais discussões são apenas mais uma distração oferecida por maya; como estabelece o Srimad-Bhagavatam (6.4.31):
yac-chaktayo vadatam vadinam vaivivada-samvada-bhuvo bhavanti kurvanti caisham muhur atma-mohamtasmai namo ‘nanta-gunaya bhumne
“Permita que eu ofereça minhas respeitosas reverências à todo-penetrante Suprema Personalidade de Deus, que possui ilimitadas qualidades transcendentais. Agindo do interior do coração dos filósofos, que propagam variados pontos de vista, Ele faz com que eles esqueçam suas próprias almas enquanto ora concordam e ora discordam entre si. Assim, Ele cria neste mundo material uma situação na qual eles não são capazes de chegar à qualquer conclusão. Ofereço minhas reverências a esse Senhor”.
Assim, o estudante da ciência transcendental é seriamente encorajado a simplesmente aceitar o que foi estabelecido por seu genuíno acarya consciente de Krsna, ou mestre espiritual. Como dito por Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakura: “É uma grande ofensa desrespeitar o acarya e buscar estabelecer uma doutrina que se oponha a ele”.

A Filosofia da Gralha e da Fruta

Para ilustrar a inutilidade de se argumentar sobre de onde a alma cai, Srila Prabhupada, certa vez, deu o exemplo da gralha e da fruta de uma palmeira indiana, a fruta tal. No topo da árvore estava uma bela fruta tal. Uma gralha foi até lá e a fruta caiu. Alguns eruditos viram aquilo e começaram a discutir. “A fruta caiu porque a gralha balançou o ramo”, um deles disse. “Não”, outro disse, “quando a gralha estava para pousar, aconteceu de a fruta cair. Isso assustou a gralha, por isso ela voou embora”. “Não”, disse um terceiro, “a fruta estava madura, e o peso do pouso da gralha soltou a fruta do galho”...
“Qual a utilidade de tal discussão?”, Srila Prabhupada perguntou.
“Se viemos dos passatempos de Krsna ou de outra fonte espiritual”, Srila Prabhupada disse, “você não está em nenhuma delas no momento. Então, a melhor política é desenvolver a consciência de Krsna para voltar para lá [para Krsna]: não se preocupe sobre sua origem”.
“No presente momento, você está nas garras de maya”, ele também escreveu, “então, nossa única esperança é nos tornarmos conscientes de Krsna e votarmos para casa, de volta ao Supremo”.
Não perca tempo com a lógica da gralha e da fruta tal, Srila Prabhupada recomendou. “A fruta está ali. Pegue-a e aproveite”.
Do site Krsna.com
Tradução por Bhagavan dasa (DvS)

domingo, 23 de dezembro de 2007

Boas Festas


















A Melhor das Gopis




Sri Radha é, dentre todas as gopis – vaqueiras namoradas do Senhor Krsna – a original. Ela é capaz de comprazer a Krsna com apenas um olhar de relance. Ainda assim, Radha sente que Seu amor por Krsna pode se tornar sempre mais grandioso, portanto Ela se manifesta como as diversas gopis de Vrndavana, que satisfazem o desejo de Krsna por relacionamentos ricos em variedade (rasa).
As gopis são consideradas o kaya-vyuha de Sri Radha. Não existe uma palavra em inglês [ou em português] equivalente a este termo, mas ele pode ser explicado da seguinte maneira: Se uma pessoa pudesse existir simultaneamente em mais de uma forma humana, aquelas formas seriam chamadas o kaya (“corpo”) vyuha (“multiplicidade de”) daquele determinado indivíduo. Em outras palavras, é a mesma pessoa, mas ocupando diferentes espaços e tempos com diferentes humores e emoções. Como a única razão da existência de Radha e Krsna é a troca de sentimentos amorosos, as gopis existem para auxiliá-lOs nesse amor.
As gopis são divididas em cinco grupos, o mais importante sendo o parama-preshtha-sakhis, as oito gopis primárias: Lalita, Vishakha, Citra, Indulekha, Campakalata, Tungavidya, Rangadevi e Sudevi. Muitos detalhes de suas vidas e serviço – incluindo a idade, o humor, o aniversário, temperamento, instrumento, cor da pele, nome dos parentes, nome do cônjuge, melodia favorita, melhores amigas, e outras informações de cada uma delas – são descritos nas escrituras Vaisnavas. Esses elementos formam a substância de uma meditação interna, ou sadhana, projetada de forma a levar o devoto para o reino espiritual. Através desta meditação, gradualmente se desenvolve prema, amor por Krsna. Essa forma avançada de contemplação, todavia, deve ser feita apenas por devotos avançados sob a guia de um mestre autêntico. Tal nível é raramente alcançado. É, portanto, recomendado que se pratique o cantar do santo nome e que se aceite o caminho regulado de vaidhi-bhakti – ou a prática da devoção sob estritas regras e regulações – como é ensinado no movimento para a consciência de Krsna. Assim se alcançará naturalmente o nível mais elevado de consciência espiritual.
A tradição Vaisnava na linha do Senhor Caitanya vê, claramente, o amor das gopis como amor transcendental da mais alta estirpe, retaliando acusações de sexualidade mundana com claras definições distinguindo luxúria e amor. Assim como o conceito da Noiva-de-Cristo na tradição cristã e o conceito cabalístico do Divino Feminino do misticismo Judaico, a verdade por trás do amor das gopis é de profunda natureza teológica e constitui o zênite da compreensão espiritual. O amor das gopis representa o amor mais puro que uma alma pode ter por sua origem divina; a única relação que tal amor talvez tenha com a luxúria mundana é a aparência, aparência esta que é desfeita tão logo se estude os livros deixados pelas autoridades puras e auto-realizadas acerca destes tópicos tão queridos ao coração.
Tradução por Bhagavan dasa (DvS)

terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Qual Nome é o Nome de Deus?


Deus tem inúmeros nomes, mas isso quer dizer que todos os nomes são nomes de Deus?

Os devotos da ISKCON estão familiarizados com esta tradução de Srila Prabhupada: “Considerar que os nomes dos semideuses, tais como o Senhor Siva ou o Senhor Brahma, estão à altura ou são independentes do nome do Senhor Visnu”. Prabhupada, em diversos de seus livros, explicou o significado deste verso. Para auxiliar a nossa compreensão de tais explicações, aqui está uma tradução palavra-por- palavra do verso:

Shivasya-o nome do Senhor Siva; shri-vishnor-Senhor Vishnu; yah-quem; iha-neste mundo material; guna-qualidades; nama-nome; adi-sakalam-tudo; dhiya-com a noção; bhinnam-diferença; pashyet-talvez veja; sah-ele; khalu-de fato; hari-nama—o santo nome do Senhor; ahita-karah-inauspicioso ou blasfemo

Serão discutidas quatro lições acerca deste verso que podem nos ajudar a evitar essa ofensa ao nome do Senhor. A primeira lição é que todos os nomes de Deus são igualmente sagrados. A segunda é que, embora todos os nomes de Deus sejam idênticos a Ele, eles revelam diferentes humores no que tange a relação do devoto com o Senhor. A terceira é que nomes que se referem a outros seres que não Deus, mesmo semideuses (devas), não são iguais ao nome de Deus. E a quarta é sobre a relação entre Siva e Krsna.

1. Todos os nomes de Deus são igualmente sagrados

Srila Prabhupada escreve: “A segunda ofensa é ver os santos nomes do Senhor em termos de distinções mundanas. O Senhor é o proprietário de todos os universos e, portanto, Ele talvez seja conhecido em diferentes lugares por diferentes nomes, mas esses nomes, de forma alguma, não qualificam Deus plenamente. Qualquer nome atribuído ao Senhor Supremo é tão sagrado quanto qualquer outro, porque todos eles se referem ao Senhor. Tais nomes sagrados são tão poderosos quanto o Senhor, e não há nada que impeça alguém, em nenhuma parte da criação, de cantar e glorificar o Senhor pelo nome que Ele é conhecido naquele determinado local. Eles são todos auspiciosos, e não se deve fazer distinção entre os nomes do Senhor como se faz com mercadorias em uma prateleira” (Srimad-Bhagavatam 2.1.11, Significado) .

Muito sofrimento, mesmo na forma de tortura e guerra, foi promovido por discussões acerca do nome do Senhor Supremo. Se você não gosta de como eu chamo Deus, você talvez me chame de herege. Mas é razoável entender que Deus, que criou e possui tudo, tem inúmeros nomes. Mesmo nós, pessoas comuns, temos muitos nomes, como nome legal, apelido entre amigos, apelido íntimo e títulos. Às vezes, o que parece ser vários nomes para Deus é apenas o mesmo termo em diferentes línguas, como nomes que significam “o Provedor”, “o Mantenedor”, “o Curador” ou “o Criador”. Seguidores das escrituras Védicas cantam uma longa canção com mil nomes de Visnu em Sânscrito, e outros sistemas religiosos ensinam noventa e nove nomes, quinze nomes e assim por diante, de acordo com sua língua e compreensão.

Se um devoto de Deus, que O chama através de qualquer um de Seus santos nomes, discrimina de forma mundana Seus outros nomes, o nome é ofendido - pois Deus está plenamente presente em todos os Seus nomes. Ele acaba por se afastar de tal pessoa reducionista que busca se engrandecer a custo de diminuir outros.

2. O nome de Krsna é o próprio Krsna, pleno de variedade espiritual

“Neste mundo”, Srila Prabhupada escreve, “o santo nome de Visnu é todo-auspicioso. O nome, a forma, as qualidades e os passatempos de Visnu são todos transcendentais, perfazendo um conhecimento absoluto. Assim, se alguém tenta separar a Personalidade Absoluta do Supremo de Seu santo nome ou de Suas qualidades, forma e passatempos transcendentais, pensando que são materiais, isso é ofensivo [...] Essa é a segunda ofensa aos pés de lótus do santo nome do Senhor” (Caitanya Caritamrta, Adi-lila 8.24, Significado) .

Primeiro aprendemos a respeitar igualmente todos os nomes de Deus. Agora aprendemos a respeitar o nome de Krsna como sendo absolutamente igual a Ele. Não há nenhuma hierarquia mundana para os diferentes nomes de Deus. Deus é um, e Seus nomes também são um. Não há mais de um Deus. Ainda assim, como o Senhor tem diversas encarnações e expansões, Seus inumeráveis nomes apresentam diferentes humores e doçuras espirituais. Alguns nomes de Krsna, por exemplo, são mais íntimos do que outros, assim como “meu bem” é uma forma mais íntima de tratar alguém do que “Meritíssimo” – muito embora possam se referir a mesma pessoa.

Nomes como “o Criador”, “o Provedor” e outros, têm relação com o papel que Deus desempenha em relação com a criação material ou com nossas vidas aqui. Assim como “juiz” e “Meritíssimo”, eles dizem sobre o “trabalho” de Deus. Tendo como foco a postura de Krsna perante nossos interesses, esses nomes tendem a ser centrados no homem.

Outros nomes de Deus são referentes a Seus passatempos em Sua morada espiritual. Embora estes nomes também indiquem a relação de Krsna com outros, esses “outros” são Seus devotos puros, não almas rebeladas.

Infelizmente, a maioria das tradições espirituais e religiosas do mundo conhece apenas os nomes de Deus referentes à criação material. Há pouco conhecimento sobre a vida pessoal de Krsna em Seu reino pessoal, ou sobre Seus nomes lá. Quando tal conhecimento existe, não é, de maneira geral, tratado como parte essencial dos ensinamentos e práticas. Em contraste, escolas Vaisnavas, especialmente o Vaisnavismo Gaudiya (que inclui o movimento Hare Krsna), provêm a seus membros ricas e detalhadas informações acerca dos devotos, atividades, nomes e morada de Krsna.

Srila Prabhupada explica que o nome Krsna é o nome supremo porque significa “o todo atrativo”. Ele inclui todos os aspectos do Senhor e destaca a opulência e a doçura das qualidades de Deus. Porque Krsna é a Personalidade de Deus original, todos os demais nomes de Deus estão incluídos em Seu nome.

Os devotos de Krsna distribuem Seu nome porque querem envolver outros na doçura divina que transpassa a meditação da opulência majestosa do Senhor. Nomes que expressam as funções de Deus neste mundo dão menos do que a satisfação plena que a alma anseia. E o Senhor sente muito mais prazer quando se dirigem a Ele em relação com Seus queridos devotos santos do que através de nomes que glorificam Seu papel neste mundo.

Assim como aqueles que conhecem apenas as atividades e nomes de Deus relacionados ao mundo material não devem rejeitar os demais nomes, da mesma forma, aqueles têm a fortuna de conhecer os nomes íntimos de Krsna não devem pensar que o conhecimento superior faz do conhecedor superior. Ao contrário, com humildade e visão equânime, aqueles que cantam e recitam mantras como o Hare Krsna, Hare Krsna, Krsna Krsna, Hare Hare, Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare devem demonstrar todo o respeito por aqueles absortos apenas na compreensão secundária. Assim daremos prazer ao santo nome.

Mesmo dentro do reino de Krsna, há variedade em termos de níveis de intimidade com Krsna. Mas tal variedade não recebe os atributos de “superior” e “inferior” como no mundo material. Uma pessoa que pensa que determinado nome é inferior porque é associado a uma atividade de menor intimidade do Senhor faz uma distinção mundana. E se uma pessoa denigre um devoto que adora Deus por um nome associado a Sua realeza, a ofensa é ainda mais grave.

Determinar se um nome de Deus em particular é embebido no humor de reverência ou no humor de intimidade não é algo muito simples, diga-se de passagem. A diferença entre nomes íntimos e nomes reverenciais pode estar mais no humor e compreensão daqueles que os pronunciam do que na sua definição literal. Mesmo as mais íntimas devotas de Krsna, Suas namoradas vaqueirinhas, às vezes chamam Krsna de Acyuta (Infalível), Vishabha (a Pessoa Mais Elevada) ou Natha (Senhor).

A distinção entre as várias formas de Deus e seus respectivos nomes não se baseia em potência, mas em relacionamentos. Assim, para manter determinados relacionamentos, algumas formas e nomes de expansões plenárias de Krsna nunca exibem certas qualidades. Cada tipo de relacionamento com o Senhor é glorioso. Quando Krsna apareceu como Seu próprio devoto, como Caitanya Mahaprabhu, Ele encorajou a todos que se focassem em Deus em Sua forma original, plena de doçura e de todos os relacionamentos - Krsna. Quando Ele se encontrava com pessoas plenamente devotadas a formas de Krsna como Ramacandra ou Narayana, todavia, Ele glorificava o apego e amor dessas pessoas por Deus.

Embora os nomes descritivos de Deus sejam inumeráveis, Ele não “tem” um nome no sentido de ter uma denominação arbitrária, temporária e diferente dEle. Uma alma condicionada é diferente de sua mente, de seu corpo e de seu nome. Assim, quando chamo o nome de minha amiga, olho para sua foto ou penso em suas qualidades, não tenho contato direto com ela. Mas Krsna, sendo absoluto, é idêntico a seus nomes, forma e qualidades. Contato com qualquer um deles é contato direto com Ele. Enquanto que há unidade e diferença simultâneas entre o Senhor e Suas energias, há apenas unidade entre Ele e Seus atributos pessoais, dentre os quais se inclui Seu nome. Dizer e ouvir o nome de Krsna com amor puro é estar plenamente em Sua presença. Essa unidade entre o Senhor e Seu nome é válida para todos os Seus nomes, sejam em relação à criação ou ao reino espiritual.

3. Os nomes de Krsna e os nomes de outros seres, como os semideuses

Srila Prabhupada escreve: “Considerar que os nomes de semideuses, como o Senhor Siva ou o Senhor Brahma, estão à altura ou são independentes do nome do Senhor Visnu. [...] Se alguém acha que pode cantar ‘Kali! Kali!’ ou ‘Durga! Durga!’, e que isto é o mesmo que cantar Hare Krsna, esta é a maior das ofensas” (O Néctar da Devoção, Capítulo 8).

A terceira lição para se evitar a segunda ofensa do Padma Purana se refere à distinção entre os nomes de Deus e os nomes de outros. Enquanto respeitamos todos os nomes de Krsna, precisamos também lembrar que nem todo nome se refere a Ele. Por exemplo, muitos nomes do Senhor Supremo, como “o Testemunhador” , podem facilmente se referir a outra pessoa que não Deus. Em um tribunal, há muitas pessoas comuns que podem ser chamadas de “testemunhadoras” . Assim, se pensarmos que qualquer testemunhador é Deus, ofendemos o nome.

De forma similar, alguns seres poderosos, embora servos de Deus, têm nomes que também podem ser usados para se referir a Ele. Embora Krsna em Sua onipotência e onipresença possa controlar e manter tudo sozinho, por seu amor Ele ocupa almas puras ou avançadas em Seu serviço. Os termos sânscritos para tais seres são deva e sura. A palavra inglesa que Prabhupada usou para se referir a essa classe de seres foi “semideuses”. Eles são entidades vivas, almas como eu e você e todas as demais formas de vida. Tendo escolhido viver em bondade e pureza, essas almas recebem corpos muito mais belos, poderosos e sutis do que as nossas formas terrestres. Toda alma tem o potencial de transmigrar para a forma de um deva, ou de cair da vida de deva para a forma humana ou inferior.

Os devas principais têm tanto títulos quanto nomes. O título do deva dirigente administrativo, por exemplo, é "Indra", que significa "dirigente máximo". O atual Indra se chama Purandara. Às vezes, um nome ou título pode se referir tanto a um deva quanto a Krsna. No último mantra do Isopanisad, uma de 108 escrituras dedicadas ao conhecimento transcendental, o Senhor Supremo é chamado de Agni, que também é o título do deva do fogo. Quando referente a Deus, Agni significa aquele que é tão poderoso quanto o fogo ou aquele que é a origem do fogo. O fato de Krsna poder ser chamado de Agni não significa que possamos reverenciar ou adorar o deus do fogo Agni como supremo.

Às vezes, dizendo-se seguidores das escrituras Védicas, pessoas adoram devas, especialmente Siva, Durga ou Ganesa, como se eles fossem encarnações plenárias de Krsna. Como descrito anteriormente, Krsna não se manifesta plenamente em todas as Suas encarnações e expansões. Pode ser confuso a princípio, portanto, aprender que Rama é a Personalidade de Deus, mas que Ganesa, por exemplo, não é.

Como saber quem é Deus e quem é um deva? Quando um nome como Agni ou Surya se refere a um deva e quando se refere a Deus? Quando alguém está chamando pelo mesmo Deus por um nome diferente, e quando alguém está chamando por algo diferente de Deus? Para responder a essas três perguntas e outras similares, é preciso buscar referência nas escrituras sob a guia de um guru autêntico, seguindo o exemplo das pessoas santas.

Os devas são devotos de Krsna em diferentes níveis de realização e aspiração. Como de toda entidade viva no mundo material, seus nomes são designações temporárias, diferentes deles. Nós automaticamente adoramos e comprazemos todos eles quando cantamos o nome de Krsna e adoramos Krsna, assim como satisfazemos todas as nossas obrigações para o governo quando pagamos nossos impostos para o banco central. Se nós nos aproximamos dos devas diretamente – o que não é de maneira geral necessário, nem mesmo recomendado – devemos fazê-lo unicamente para mostrarmos respeito por eles como agentes de Deus ou para pedir que nos ajudem a servir o Senhor Supremo. A melhor maneira de se adorar os devas é com comida e artigos que foram primeiramente oferecidos a Krsna. Embora devamos respeitar as escrituras e tradições que encorajam a adoração a devas porque eles gradualmente elevam seus adoradores, aqueles que buscam pelo amor puro por Deus devem adorar Krsna em todo ritual que sugira adorar algum deva.

4. A Posição de Siva

Em seu comentário ao Brhad-Bhagavatamrta (1.2.86) de Sanatana Gosvami, Gopiparanadhana Dasa, discípulo de Srila Prabhupada, baseando-se no próprio comentário de Sanatana Gosvami, escreve: “O Padma Purana traz uma lista de dez ofensas ao cantar dos nomes do Senhor Visnu. Ali está declaro: ‘Aquele que vê diferença entre os nomes e qualidades de Siva e os nomes e qualidades de Visnu é antagonista ao hari-nama’. O Senhor Visnu não tolera ofensas contra o Senhor Siva, porque o Senhor Siva é a mais poderosa encarnação dotada de poder do Senhor Visnu. O Senhor Siva é especialmente dotado com o poder de distribuir no mundo material o elevado gosto do serviço devocional puro”.

O Senhor Siva é absoluto entre os devas. Ele é uma encarnação de Krsna, mas ele é, de alguma maneira, diferente de Krsna, assim como o iogurte é leite mas não é leite. Ele possui qualidade acima daquelas de qualquer outra entidade viva e tem eterno domínio sobre a matéria. Pensar, todavia, que o nome e a personalidade de Siva são idênticos ao nome e personalidade de Krsna é ofensivo. E também é ofensivo vê-los como diferentes.

A maneira perfeita de compatibilizar a posição de Siva e de Krsna é adorar Siva como uma encarnação modificada de Krsna que considera a si mesmo como devoto e servo de Krsna. Em Sua encarnação como Siva, Krsna age como o tempo que a tudo destrói e como o pai de todas as entidades vivas. Assim como Krsna, ele é independente da matéria; como Siva, Ele tem como Sua consorte a energia material personificada. Quando adoramos Krsna de forma apropriada, Siva está incluído e satisfeito. Mas se adoramos Siva de outra forma que não como um Vaisnava, um devoto de Krsna, então, nem o Senhor Siva ficará plenamente satisfeito, nem Krsna terá sido devidamente reverenciado.

Conclusão

Há muitos nomes de Deus e muitos caminhos que conduzem a Ele, assim como há muitos caminhos e nomes que levam a outros lugares. Várias companhias aéreas e rotas podem nos levar a Tóquio. Se durante nossa viagem para Tóquio, pensamos estar no único avião que vai para lá, ou mesmo na única linha aérea, intoxicamos a nós mesmos com o álcool do orgulho. Claro que nem toda empresa aérea tem vôos para o oriente, tampouco todo avião que está cruzando os ares neste momento está indo em direção a Tóquio, ou talvez nem sequer esteja indo para o Japão. Dentre as empresas aéreas que de fato vão até Tóquio, algumas têm rotas mais diretas, melhores serviços ou menores preços.

Aquele que cuidadosamente estuda a ciência de bhakti, a ciência do serviço devocional a Krsna, que inclui a prática do cantar de Hare Krsna, irá rapidamente entender que esta rota do amor por Deus é direta. O vôo inclui amplo serviço de bordo, e o preço é apenas um pouco de desejo sincero. Para que nosso cantar de bhakti seja efetivo, devemos distinguir entre adoração ao Absoluto e ao relativo, enquanto honramos todas as formas e nomes do Absoluto. Então, nosso cantar de Hare Krsna irá, sem demora, dar-nos a realização de nosso eu e de nossa doce relação com o único, o todo atrativo Senhor Sri Krsna.
por Urmila Devi Dasi (ACBSP)
Tradução por Bhagavan dasa (DvS)

segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

Krsna é Nosso Senhor ou Nosso Servo?


Definindo "Pecado"

O que, exatamente, devemos entender por “pecado”? E existe diferença entre pecado deliberado e pecado acidental?

Algumas definições dadas por Srila Prabhupada são “quebrar as leis da natureza”, “envolver-se exageradamente na complexidade da natureza material” e fazer algo que “nos conduza para longe do Senhor Supremo”. Uma vez que entendemos que nossa natureza é essencialmente prestar serviço amoroso a Krsna, qualquer outra coisa, ou qualquer coisa oposta, é pecado. Pecado não é exatamente algo ruim que Deus não quer que você faça porque Ele é um ditador cruel, mas é algo que causa miséria por ser contra a natureza do eu.

A natureza do corpo humano, por exemplo, é de digerir materiais orgânicos, especialmente frutas, grãos, vegetais e semelhantes. Se escolhemos comer plástico, fazemos algo contra a natureza ou “lei” do corpo, e teremos, portanto, que sofrer. De forma similar, qualquer coisa que pensemos, falemos ou façamos, que não nutra nosso amor por Krsna, é espiritualmente indigesta e nos trará a dor do envolvimento material, que é a doença da alma.

Uma pessoa cuja consciência esteja em desarmonia com Krsna talvez não saiba, todavia, o que é de acordo com a realidade espiritual e o que não é: por isso as escrituras autorizadas listam as atividades condenáveis que requerem expiação. Tais atos – do corpo, da mente ou da fala – são pecados.

Sem outra possibilidade, aquele que não alcançou o pináculo da pureza vive em um estado intermediário entre vida pecaminosa e vida pura. Enquanto nos esforçamos pela obtenção da pureza, retemos ainda diversas impressões mentais de pecados e a forte tendência de usar nosso corpo, mente e palavras de maneiras que nos afastam de Krsna. Srila Visvanatha Cakravarti Thakura escreve em seu Madhurya Kadambini: “Percebendo que o desfrute material lhe separa de Krsna e tira sua constância no serviço devocional, o devoto decide renunciar seus vícios e toma refúgio no santo nome. Mas, por diversas vezes, o esforço para a renúncia termina no desfrute do que se está buscando renunciar”.

Esforçando-se por Melhorar

Essa luta contra nossa tendência de nos afastarmos de Krsna não é grande problema se continuamente aceitarmos o desafio de melhorarmos.

Krsna explica: “Tendo despertado interesse por assuntos referentes a Mim, Meu devoto toma desgosto por todas as atividades materiais, sabendo bem que a gratificação dos sentidos conduz a misérias. Ainda assim, embora tente, ele não é capaz de abandonar seus desejos materiais e às vezes se ocupa na miserável gratificação sensorial. Mas, tendo se arrependido de tais atividades, ele deve simplesmente adorar-Me com amor, fé e firme devoção” (Srimad-Bhagavatam 11.20.27-28) .

Srila Prabhupada escreve: “Um homem que tem fé firme nos eternos preceitos do Senhor, mesmo que seja incapaz de executar tais ordens, liberta-se do cativeiro da lei do karma. Ao ingressar na consciência de Krsna, talvez ele não cumpra na íntegra os preceitos do Senhor, mas, porque não se deixa abater por tal limitação e trabalha sinceramente sem se preocupar com derrota ou fracasso, certamente será promovido à fase da pura consciência de Krsna” (Bhagavad-gita Como Ele É 3.31, Significado) .

Pequenos pecados que cometemos enquanto nos esforçamos por melhorar são considerados acidentais. Por nos arrependermos, podemos queimar a reação de tais pecados. Mas se pecamos pensando que ordinárias penitências religiosas ou atividades transcendentais, como o cantar dos santos nomes, vão nos livrar da reação, então, ao invés de ser reduzida, a reação será ainda maior.

Se uma pessoa aceita externamente a aparência de uma pessoa religiosa, ou pessoa santa, enquanto continua secretamente fazendo atividades materialistas para o prazer dos sentidos, tal comportamento também se enquadra na ofensa de se cometer atividades pecaminosas apoiando-se na força do cantar. Há ainda outros aspectos mais sutis. Podemos, por exemplo, pensar: “Eu sou um devoto de Krsna e Lhe dou prazer de várias maneiras. Se eu fizer só essa pequena coisa errada, certamente Ele vai deixar passar”.

Buscando por Ajuda

Para que o nosso cantar seja pleno, portanto, devemos abandonar definitivamente nossa tendência a trapacear. Não devemos deixar que tal tendência sequer coloque a unha do dedão de seu pé para dentro de nossa mente. Se depararmos conosco planejando usar Krsna e Seu nome como cobertura para nossos objetivos ardilosos, devemos pedir com muita força pela proteção de Krsna. Nossos gurus – tanto aquele que nos iniciou no cantar quanto aqueles que nos dão instruções espirituais relevantes – são nossos guardiões, e também podem afugentar os ladrões do pecado e da trapaça se nós recorrermos com muita humildade e determinação a eles.

Um remédio para todos os tipos de obstáculo é a companhia próxima e regular de devotos puros de Krsna. Seus exemplos e ensinamentos ajudam-nos a reconhecer nossas dificuldades e a desejar nos tornarmos livres delas.

Naturalmente, nós não queremos apenas nos livrar do desejo de usar o cantar para nos livrarmos do sofrimento de atividades pecaminosas, mas queremos nos livrar de toda a nossa tendência a executar atividades pecaminosas.

Apenas uma vida plenamente em harmonia com a verdade de nossa natureza espiritual irá nos dar a satisfação que estamos sempre buscando. E apenas uma vida pura irá preparar o solo do jardim no qual as flores e frutas do amor por Deus irão nascer.

Nós jamais cometeremos atividades pecaminosas se formos indiferentes ao ilusório desfrute material. Parte de tal indiferença vem naturalmente se temos o prazer superior do serviço a Krsna. E, ao mesmo tempo, devemos estudar a verdadeira natureza da vida material a partir das escrituras e das pessoas santas. A raiz do pecado é a ignorância, ou o ato de ignorar a verdade óbvia de que certas atividades nos distanciam de Krsna. O resultado das atividades pecaminosas são o nascimento, a morte, a velhice e as doenças. Uma pessoa jamais encontrará satisfação nos prazeres do corpo e da mente enquanto separada de Krsna, e, mesmo coisas que pareçam satisfatórias por algum tempo, logo de esvairão, sendo temporárias por natureza. Por que desfrutar do que é temporário e superficial? Tal desfrute é a verdadeira natureza do pecado.

A Proteção de Krsna

Krsna promete: “É Minha promessa proteger todo aquele que, ao menos uma vez, renda-se a Mim dizendo com grande sinceridade, ‘Meu querido Senhor, a partir deste dia, sou Seu’. Eu torno tal pessoal destemida de imediato, e ela vive eternamente segura” (Ramayana, Yuddha-khanda 18.33). De que Krsna protege tal pessoa rendida? Krsna diz: “Simplesmente renda-se a Mim. Eu o libertarei de todas as reações pecaminosas. Não tema” (Bhagavad-gita 18.66). Essas reações pecaminosas incluem o próprio desejo – e o desejo em potencial – de pecar.

E como nos rendemos? Nós aceitamos tudo o que for favorável para nossa vida espiritual e rejeitamos tudo aquilo que for desfavorável. Aprendemos das escrituras, dos gurus e das pessoas santas o que é favorável e o que não é favorável. Percebemos que, por fim, apenas Krsna é nosso protetor e mantenedor, e, portanto, para sermos felizes, temos de tornar Seus desejos os nosso. E não importa quais sejam nossas qualificações e conquistas, nós damos os créditos a Krsna, permanecendo sempre humildes.

Essa postura de rendição irá rapidamente dar cabo de nossa tendência a pecar e a utilizar erradamente o santo nome para o fim de nos livrarmos de nossas premeditadas ações pecaminosas. Essa postura permitirá que a beleza e o poder do nome brotem com todo o esplendor em nossos corações.
por Urmila Devi Dasi (ACBSP)
Tradução por Bhagavan dasa (DvS)

domingo, 16 de dezembro de 2007

Entre a Matéria e o Espírito




Como universitário, percebo que é um tanto difícil encontrar uma disciplina sobre fantasmas na grade de disciplinas de algum curso ou entre as disciplinas facultativas. Igualmente raro são cursos com títulos do tipo “Poderes Psíquicos II” ou “Formas Alienígenas de Vida”. De fato, parece não ser incentivado nenhum tipo de estudo acerca de qualquer fenômeno paranormal. Por que o meio acadêmico é tão relutante em aceitar esse inegável e cada vez mais freqüente aspecto da realidade? Talvez por pensarem que só há duas maneiras de se entender tais coisas como fantasmas: Ou eles simplesmente não existem e são produto da fantasia, alucinação e erro do homem; ou eles existem e são completamente diferentes de qualquer coisa que conheçamos e entendamos e, portanto, são um completo mistério. Nenhuma das duas visões deixa muito espaço para pesquisas acadêmicas ou instruções a nível universitário. Tal falta de movimentação talvez tenha a ver com como entendemos a mente.
Desde o tempo de Descartes, a filosofia ocidental vem se complicando com o que se chama de “problema corpo-mente”. A mente seria meramente uma propriedade emergente do corpo físico destituída de existência independente, como muitos filósofos modernos defendem? Ou a mente seria algo completamente diferente da matéria, como os Cartesianos (seguidores de Descartes) querem que acreditemos? Para aqueles que vêm a mente como idêntica à matéria, a experiência da consciência deve ser aceita como uma espécie de ilusão e desprezada enquanto objeto de estudo científico. Por outro lado, para aqueles que subscrevem à segunda visão (conhecida como dualismo Cartesiano), a mente certamente existe, mas é mais ou menos incompreensível. Enquanto que as atividades do corpo agem conforme as leis da física, a mente é aparentemente livre de tais leis. Independente de suas diferenças, ambas as visões situam a mente acima da investigação e da compreensão prática. E, por fim, nenhuma delas é satisfatória intelectualmente ou elegante ao meio acadêmico.
A literatura Védica da antiga Índia apresenta uma terceira alternativa. Sri Krsna, no Bhagavad-gita, explica a Seu amigo Arjuna que a mente, a inteligência e o falso ego são três de Suas oito energias materiais que, juntas, compõem o corpo sutil; enquanto que Suas outras cinco energias matérias (terra, água, ar, fogo e éter) compõem o corpo grosseiro, ou físico. Esse conceito de “corpo sutil” como a combinação da mente, inteligência e falso ego é o equivalente Védico para a “mente” da filosofia ocidental. Entendida dessa plataforma, a mente não é nem completamente transcendental as leis que governam a matéria, nem é sujeita as mesmas leis a que se sujeita o corpo grosseiro. Em outras palavras, as atividades da mente podem ser mensuradas e previstas, mas os cientistas modernos não têm nem as ferramentas nem o conhecimento teórico para tal.
Então, temos aqui três maneiras de se conceber a mente: como completamente idêntica à matéria (Modelo Moderno), como completamente oposta à matéria (Modelo Cartesiano), e como matéria sutil entre a matéria grosseria e a energia espiritual pura (Modelo Védico).
Outra forma de entender a diferença entre esses três modelos é observar a quem eles apontam como o eu. O Modelo Moderno indica o corpo em si como o eu, sem nenhuma entidade independente ou superior. O Modelo Cartesiano indica a mente como o eu, sendo o corpo um veículo. O Modelo Védico indica o eu como uma entidade completamente espiritual, que ocupa temporariamente tanto um corpo sutil quanto um grosseiro. O Modelo Védico abre possibilidades para a pesquisa e estudo do reino sutil, o que não é possível tomando por base um dos outros dois modelos. Vejamos como seria isso.
Poderes Psíquicos
O estudo de habilidades psíquicas, tais como a habilidade de se ler mentes (telepatia) ou a de se mover objetos com a mente (telecinesia), é atualmente marginalizado no âmbito acadêmico. E isso não é surpreendente. Dentro das possíveis escolhas atuais, podemos ou seguir o Modelo Moderno e simplesmente negar a existência de poderes psíquicos, ou podemos seguir o Modelo Cartesiano e aceitar a existência de tais habilidades, mas sem podermos explicá-las, restando-nos apenas dar a elas o tratamento de “milagres”. Se seguirmos o Modelo Védico, todavia, e entendermos a mente simplesmente como outro tipo de matéria, podemos, ao menos, aceitar em teoria que tais interações entre a mente e o reino físico são possíveis. O que restaria seria experimentar e determinar quais tipos de leis regulam a mente (o corpo sutil), e como elas diferem das leis que afetam o corpo grosseiro. A literatura Védica certamente pode ajudar tal pesquisa fornecendo rica estrutura teorética.
Fantasmas
Se a mente é apenas outro tipo de corpo através do qual uma pessoa pode agir, seria possível que algumas pessoas tivessem apenas esse tipo de corpo, sem sua contraparte física? É exatamente assim que a literatura da antiga Índia explica os fantasmas – outro fenômeno que o Modelo Védico da mente pode desmistificar. As leis do Modelo Moderno anulam completamente a possibilidade de existirem fantasmas. Eles não podem ser percebidos pelos meios tradicionais, então eles não existem. O Modelo Cartesiano, como alternativa, reconhece uma realidade intangível acima do corpo, então, em teoria, não haveria problemas em admitir a existência de fantasmas. Na prática, todavia, a idéia de fantasmas permanece acima da investigação racional devido ao fato da realidade intangível a que pertencem não ter nada em comum com a matéria. E, afinal, a matéria é tudo com o que nossos instrumentos e métodos científicos são capazes de lidar. Aqui, novamente, o Modelo Védico abre novas portas. Fantasmas podem ser entendidos como entidades vivas que possuem mente, ou corpo sutil, mas não forma física, ou corpo grosseiro. Tal visão auxilia desfazer a nuvem de medo e mistério que de maneira geral acompanha tais seres vivos. Podemos encontrar conforto no fato de que, longe de serem mágicos ou míticos, fantasmas não são, fundamentalmente, diferentes de você ou de mim. Eles apenas existem em outro estado material que ainda está para ser conhecido pela classe científica.
Seres de Outros Planetas
Se seres exatamente como nós podem existir sem a necessidade de um corpo físico externo que possamos perceber diretamente, poderiam existir outros tipos de seres corporificados acima de nossa percepção sensorial? A literatura Védica responde com um enérgico sim: Os demais planetas do universo são povoados, mas por seres de consciência superior, e corpos coerentemente superiores. O Modelo Moderno atribui a visão de óvnis e de outros seres alienígenas à falsificação de imagens e ao poder de imaginação da mente. O Modelo Cartesiano relega tais seres ao reino angélico.
O Modelo Védico, em contraste, dá suporte a uma abordagem mais positiva e produtiva ao estender o domínio do corpo sutil. Formas sencientes de vida em outros planetas são entendidas como tendo, de acordo com seu status, ou nenhum corpo grosseiro e apenas corpo sutil, ou um corpo grosseiro mais refinado, que exibiria características semelhantes ao nosso corpo sutil. Muitos deles, por exemplo, podem voar ou mudar sua forma à vontade, feitos que só temos acesso em nossos pensamentos e em sonho (o reino da mente/corpo sutil). Contudo, seus corpos também são materiais. Esses seres em corpos mais sofisticados não são isentos, portanto, das limitações que afetam outras entidades materialmente corporificadas, como a morte. Portanto, não há impedimento de que interajam com formas mais grosseiras de matéria (como nossos corpos). Assim, a busca humana por fazer contato com seres de outros planetas não é em vão. Munidos de tal concepção, nossa busca por inteligência extraterrestre precisa apenas dispor de um novo conjunto de instrumentos que vá além da tradicional percepção dos cinco sentidos. Eles estão, sim, lá fora, e podem ser contatados - só é preciso que consideremos com seriedade a literatura Védica e refinemos nosso processo.
Muito Além da Mente
É muito interessante entender o funcionamento da mente com a ajuda do Modelo Védico, mas, talvez perguntem, e quanto à alma? Krsna, após falar dessas Suas oito energias materiais, fala de uma energia Sua que é superior e intocada pelas leis materiais. Tendo aceitado o Modelo Védico de mente, a pessoa certamente desejará também estudar o verdadeiro eu espiritual para entender os corpos materiais temporários. Os Vedas, de fato, instam-nos a estudar exatamente a partir do prisma do verdadeiro eu. Para aqueles prontos para tal estudo definitivo, os Vedas providenciam o conhecimento necessário, bem como os processos práticos. Mas, antes de nossos colegas universitários aderirem disciplina tão ambiciosa, talvez comecem estudando o reino que fica entre o mundo material, que conhecemos tão bem, e a realidade espiritual, que transcende nossa compreensão. Talvez a comunidade científica deva começar sondando essa área sutil da mente e ampliando sua área de investigação para incluir fenômenos como poderes psíquicos, fantasmas e vida em outros planetas. Tal busca traria um conhecimento que poderia ser usado com o fim de aprimorar nossa vida material neste mundo, bem como de nos conduzir ruma à compreensão de nossa vida espiritual muito além desse reino ordinário. Enquanto esse dia não chega, sigo me matriculando nas disciplinas tradicionais… aguardando.

por Navin Jani
Tradução por Bhagavan dasa (DvS)

sábado, 15 de dezembro de 2007

Respeito por Aqueles que Distribuem o Santo Nome




O Senhor Krsna se revela através de Seus santos nomes para aquele que honra e obedece a Seus agentes.

A cidade celestial de Indrapuri é a residência de Indra, um dos devas que administram os diferentes setores do universo como um serviço ao Senhor Supremo, Krsna. Em Indrapuri, a essência da fumaça do incenso aguru se mistura com a fragrância das flores que decoram os jardins e corpos dos residentes da cidade. Cordões de pérolas naturais adornam as construções, e bancos feitos de diamantes e pedras corais são dispostos ao longo das impecáveis rodovias. Indrapuri é livre do pecado, da ardileza, da luxúria, do orgulho, da inveja, da violência e de outros frutos do falso orgulho.

A esposa de Indra, Saci, senta-se a seu lado em seu trono, enquanto dançarinas e cantores desse paraíso material mantêm os dois entretidos com músicas que glorificam Krsna. Uma sombrinha branca, que brilha como a lua, é o dossel real de Indra.

Embora Indra seja um poderoso deva, seus inimigos, os asuras (demônios), foram capazes, certa vez, de atacar seu reino paradisíaco e de ferir Indra, bem como seus associados. Por ter desrespeitado seu mestre espiritual, Indra se tornou vulnerável.

Uma vez, quando estava desfrutando de sua riqueza e poder sentado em seu trono, Indra viu Brhaspati, seu guru, entrar no salão do palácio. De acordo com a etiqueta, Indra deveria ter ficado de pé para recebê-lo, oferecer-lhe um acento, palavras agradáveis e algo para beber. Mas, porque Indra via Brhaspati diariamente, ele o ignorou. Ofendido, Brhaspati foi embora.

Indra rapidamente deu conta de seu descuido e tomou as providências para se retificar – ele passou a procurar por seu guru para cair a seus pés mostrando arrependimento. Brhaspati, todavia, querendo ensinar a Indra uma lição, tornou-se invisível. Como Indra perdera as bênçãos de Brhaspati, forças demoníacas foram capazes de atacar Indrapuri, ferindo Indra e outros.

A Importância do Mestre Espiritual

Assim como Indra, todo ser humano precisa da graça do mestre espiritual. Talvez não tenhamos que confrontar inimigos como os de Indra, mas certamente precisamos de proteção uma vez que temos uma grande missão na forma de vida humana: avançar espiritualmente. “Demônios”, tais como nossos desejos por coisas materiais, constantemente buscam nossa destruição.

Aqueles entre nós que aceitaram a consciência de Krsna querem alcançar um reino muito superior ao de Indrapuri. Temos como meta o mundo espiritual, o reino de Deus, Krsna. Nós sabemos que o prazer decorrente do serviço a Krsna em Sua morada é superior a qualquer coisa que Indra possa desfrutar. Nossa súplica para que recebamos permissão de participar de tal serviço devocional é o mantra Hare Krsna, Hare Krsna, Krsna Krsna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare.

Só poderemos entender o cantar de Hare Krsna quando aprendermos a razão da vida através de um guru fidedigno. O ser humano, em geral, fica perdido ao ver a gigantesca criação que lhe rodeia. Apenas com o uso da observação e de experiências, pessoas conseguem, às vezes, entender que um ser inteligente criou tudo isto para algum propósito. A natureza do criador, o propósito de Sua criação, e os meios para se harmonizar com esse propósito, entretanto, foge de suas capacidades. Tais tópicos devem ser revelados a partir de pessoas acima da criação: o criador ou o Seu representante. Assim, para entender esses tópicos, todos precisam de um guru. Todos os gurus também têm gurus, sendo que o Senhor em pessoa é o guru original. O princípio de se aceitar orientação pessoal na missão da vida é tão importante que quando Krsna nasce Ele também aceita um guru para estabelecer o exemplo.

Quando encontramos um guru genuíno, que vem de uma corrente de mestres e discípulos que tem início com o próprio Senhor, aprendemos que a criação tem por objetivo ajudar as almas caídas a esgotarem seus desejos materiais e, por fim, retornarem a posição espiritual original que lhes cabe. Um guru genuíno também ensina que o principal meio de se alcançar o propósito supremo da existência – união amorosa com Krsna – é o cantar de Seus santos nomes, especialmente através do maha-mantra: Hare Krsna, Hare Krsna, Krsna Krsna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare.

Iniciação e Treinamento Espiritual

Mesmo para se saber do nome do Senhor é preciso ter algum contato com um guru. Então, inquestionavelmente , qualquer um que decida dedicar sua vida a Krsna precisará de treinamento contínuo de um guru. Da mesma forma que um jovem casal formaliza sua relação com o casamento, ou um estudante oficialmente se matricula em uma escola, uma pessoa que trata com seriedade o amor e a rendição a Krsna compromete-se de maneira formal. Quando tornamo-nos oficialmente iniciados dentro de uma linhagem de mestres e discípulos, o guru que nos iniciou, os vários mestres anteriores e o próprio Senhor se comprometem a nos auxiliarem rumo à liberação de todos os desejos materiais. Na vida comum, quando a secretaria de uma escola aceita um estudante, todos os professores e funcionários, até o diretor-proprietá rio, asseguram dar o melhor de si para garantir a educação e graduação do aluno. Similarmente, um discípulo sincero em uma escola transcendentalista certamente alcançará sucesso espiritual. No momento da iniciação, o guru “planta a semente da devoção” e entrega o santo nome pedindo que Krsna se manifeste no cantar daquele novo iniciado.

Krsna não irá se manifestar no cantar daquele que desrespeita o guru – tanto o guru do qual se conheceu o cantar quanto o guru do qual se recebeu a iniciação formal para a vida devocional. Mesmo em escolas comuns, estudantes que não demonstram bons modos para com seus professores podem ser negligenciados ou até mesmo expulsos. Quanto descontentamento sente o Senhor quando alguém desrespeita um mestre espiritual!

A ofensa ao santo nome de desrespeitar ou desobedecer ao guru vem da idéia equivocada de considerar o guru como uma pessoa comum. Tudo bem que o guru parece muitas vezes ser semelhante a nós, aparecendo em um corpo material constituído dos mesmos ingredientes que constituem todos os demais corpos. Mas o guru é o representante de Deus, é realizado na ciência da devoção e, portanto, não é uma pessoa comum. Embora oficiais da polícia sejam seres humanos como eu e você, nós os tratamos com respeito diferenciado uma vez que eles representam o governo e conhecem as leis. Respeitamos um professor como um representante da escola e como uma autoridade em determinado conhecimento que não temos ou que temos em menor quantidade ou realização. Por tais exemplos, podemos facilmente entender porque se deve tratar o guru, como nos é ensinado, como se fosse Deus: o guru é o representante de Deus e nossa ponte até Ele.

Gratidão e Respeito

As escrituras listam maneiras específicas pelas quais os discípulos devem demonstrar respeito para com o guru. Eles devem, por exemplo, borrifar sobre suas cabeças a água que banhou os pés do guru e, ao verem o guru, devem oferecer reverências caindo ao chão. Não devem usar a cama do guru, seu acento, sapatos ou meios de transporte pessoais, adorar outras pessoas na presença do guru, ou agir ou falar de maneira que desagrade o guru.

Deve-se primeiro adorar o guru e, então, pedir permissão para adorar Krsna. Portanto, juntamente com a ilustração ou deidade de Krsna, um discípulo deve manter a foto de seu guru. O incenso, as flores, e tudo o mais, devem ser oferecidos primeiramente ao guru e então a Krsna. Mesmo enquanto se canta o santo nome de Krsna, deve-se manter o guru na mente, plenamente grato pelo presente do maha-mantra.

Espera-se que o discípulo não seja apenas respeitoso, mas também obediente. As instruções do guru – sejam pessoais ou escritas – devem ser a vida e alma do discípulo. O guru frequentemente oferece instruções gerais e individuais. Algumas podem ser aplicadas em todos os tempos, locais e circunstâncias, como a instrução de sempre se lembrar de Krsna e nunca se esquecer de Krsna. Algumas devem ser aplicadas de diferentes maneiras e níveis, dependendo da situação. E nem tudo o que o guru diz constitui uma ordem; ele também pode oferecer diretrizes gerais.

O discípulo deve evitar tanto ser negligente com as regras quanto segui-las de forma cega e fanática. O segredo é distinguir entre princípios internos e detalhes externos. Krsna, enfim, diz que o discípulo deve fazer perguntas relevantes ao guru e seguir o exemplo prático dos santos, ou sadhus.

Prevenindo-se Contra Farsantes

Algumas pessoas talvez pensem que as regras escriturais referentes ao respeito que deve ser mostrado ao guru são excessivas. Todavia, respeito por uma pessoa que representa ou fala por um poder superior é sinal de cultura e civilização. As normas de nossa sociedade moderna, por exemplo, exigem que respeitemos nosso empregador, o professor ou um juiz de direito.

Infelizmente, sempre haverá pessoas buscando por respeito e prestígio se auto-proclamando autoridades espirituais, da mesma forma que há criminosos que se vestem como policiais, e empresas e escolas que enganam pessoas inocentes roubando seu dinheiro através de ardilosas trapaças. Assim, um discípulo precavido deveria analisar cuidadosamente se determinado guru é discípulo de uma linhagem autorizada de mestres e discípulos da mesma forma que uma mãe examina as credenciais de uma escola antes de matricular seus filhos. Uma das principais qualificações que um guru deve apresentar é conhecimento acerca de Krsna – não apenas conhecimento teórico, mas conhecimento realizado demonstrado através da dedicação de sua vida para o prazer do Senhor.

De maneira geral, quando um guru autêntico é encontrado, estabelece-se uma relação eterna. De qualquer maneira, um guru é obrigado a abandonar um discípulo que por repetidas vezes cometa falhas graves no caminho da vida espiritual, e um discípulo deve rejeitar um guru caído.

Krsna é um Presente dado pelo Guru

Se comprazemos nosso mestre espiritual, Krsna, então, na forma de Seu santo nome, rapidamente se revela a nós, mesmo que não tenhamos outras qualificações. Esse princípio existe mesmo em relações materiais comuns. Um professor influente dentro de uma universidade, por exemplo, percebendo que certo estudante parece ter um futuro promissor, recomenda o jovem a um programa – de estudo no exterior, por exemplo – que o estudante não teria acesso de maneira geral. A instituição irá respaldar a recomendação do professor. Krsna reciproca de forma similar Seus queridos devotos. Se o representante de Krsna está satisfeito com nosso serviço, Krsna nos aceita apesar de nossos defeitos. Assim, os obstáculos ao nosso cantar são removidos, e nosso progresso se faz de forma certa e segura.
por Urmila Devi Dasi (ACBSP)
Tradução por Bhagavan dasa (DvS)

Recebendo e Compartilhando o Santo Nome



As glórias do nome do Senhor é um tema confidencial que deve ser transmitido com grande zelo.

Dentre os vários presentes que ganhei em meu aniversário de seis anos estavam diversos pares de meias vermelhas. Como a maioria das crianças, eu preferia brinquedos a roupas – especialmente roupas repetidas. Então eu fui emburrada para o meu quarto. Como qualquer outra mãe faria, minha mãe disse que era para eu voltar para a sala, sorrir e dizer “obrigada” - eu gostando ou não dos presentes.

Nós frequentemente demonstramos o quanto algo vale para nós pela maneira com que cuidadamos de tal coisa. Se eu tenho respeito pelo presente ou por quem me deu o presente, eu coloco o objeto em uma posição de prestígio ou o dou para alguém de que gosto muito. Dar o que ganhei para uma pessoa indigna ou jogar de qualquer maneira o presente dentro do guarda-roupa demonstra minha falta de apreço pelo presente e pode trazer muito desprazer para quem me deu.

Há um exemplo disso nas escrituras. Quando o sábio Durvasa estava caminhando pela rua, ele viu Indra, o administrador- chefe dos planetas celestiais, passando montado em seu elefante. Durvasa, com muita satisfação, ofereceu a Indra uma guirlanda de seu próprio pescoço. Mas o orgulhoso Indra pegou a guirlanda e, sem nenhum respeito por Durvasa Muni, colocou o ornamento na presa de seu elefante. Sendo um animal, o elefante não podia entender o valor da guirlanda e a jogou no chão pisando por cima dela enquanto continuava a caminhar. Presenciando tal comportamento ofensivo, Durvasa Muni amaldiçoou Indra a se tornar muito pobre. (Srimad-Bhagavatam 8.5.15-16, Significado) .

O fato de Indra desejar compartilhar um presente é louvável. Dar em caridade nossas posses, sejam elas conquistadas ou recebidas, é purificador mesmo para os santos. O problema do ato de Indra é que ele deu em caridade a um animal. Krsna ensina no Bhagavad-gita que caridade deve ser dada a uma pessoa digna, em local e hora apropriados e sem expectativa de recompensa. Se a caridade é dada a alguém que fará mau uso dela, ou se é dada de forma desrespeitosa, aquele que faz a caridade, ao invés de avançar material ou espiritualmente, se torna envolvido com a ilusão da ignorância.

O maior tesouro de todos é o santo nome do Senhor, Krsna. É mais precioso que a jóia cintamani, que pode transformar ferro em ouro. O fato de termos recebido o santo nome demonstra o amor por parte daqueles que nos deram e também nossa determinação em conhecer e amar o Senhor Supremo. Conhecer a glória, o poder e o amor do maha-mantra – Hare Krsna, Hare Krsna, Krsna Krsna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare – é conhecer a mais íntima e essencial verdade. Tendo o precioso santo nome, certamente devemos dá-lo em caridade.

De qualquer forma, tal tesouro – o nome de Krsna, que é idêntico a Ele –, manifesta sua paz e prazer em plenitude apenas para aquele que o honra. Uma das principais maneiras de honrar o nome é sendo prudente ao revelar detalhes das glórias do nome. Se falamos da doçura e grandeza do nome para alguém que se tornará ofensor, também fazemos parte de suas ofensas, e nosso avanço espiritual é comprometido. Jesus disse: “Não deis aos cães o que é santo, nem lanceis aos porcos as vossas pérolas, para que não suceda que eles as calquem com os seus pés, e que, voltando-se contra vós, vos dilacerem” (Mateus 7:6). De forma similar, Krsna diz a Arjuna: “Este conhecimento confidencial [render-se amorosamente a Krsna] jamais pode ser explicado àqueles que não são austeros, nem devotados, nem se ocupam em serviço devocional, e tampouco a alguém que tenha inveja de Mim”. (Bhagavad-gita 18.67).

Dando o Santo Nome

A solução seria manter o conhecimento espiritual apenas conosco? Não. Se por medo de darmos o santo nome para pessoas invejosas nós deixamos de compartilhar nossa riqueza espiritual, tornamo-nos igualmente invejosos. Srila Prabhupada disse a uma de suas discipular, uma excepcional cozinheira, que, para evitar ser alvo de inveja, ela deveria ensinar suas habilidades a outros. Uma pessoa invejosa ou quer tirar de uma pessoa o que ela tem ou quer impedir previamente que ela tenha acesso a uma de suas próprias opulências. Ao contrário, devemos desejar que os outros se tornem tão espiritualmente ricos e afortunados quanto nós, ou mesmo mais que nós. Além do que, ao dar em caridade a consciência de Krsna a uma pessoa digna, comprazemos Krsna e, consequentemente, aumentamos nosso prazer no processo do cantar.

Compartilhar o santo nome e a estonteante beleza das atividades, qualidades e formas de Krsna com uma pessoa piedosa e sincera traz grande prazer e satisfação. A troca de conhecimento e júbilo tanto entre aqueles que compartilham o entendimento do serviço devocional quanto entre Krsna e tais pessoas é tão puro e emocionante que é praticamente indescritível. Krsna diz: “Para aquele que explica aos devotos este segredo supremo, o serviço devocional puro está garantido, e, no final, ele voltará a Mim. Não me há neste mundo servo mais querido, nem nunca jamais haverá”. (Bhagavad-gita 18.68-69).

Como discernir onde e com quem compartilhar o nome? O Senhor pessoalmente, em Seu nascimento como Caitanya Mahaprabhu, cantaria nas vias públicas com Seus devotos, deixando ao encargo dos ouvintes tirarem ou não proveito daquele cantar. Ele, todavia, era muito cuidadoso quanto a discutir detalhes íntimos da vida espiritual com aqueles que tinham a tendência a criticar. Antes de compartilharmos algo além do som do santo nome com alguém, devemos tentar encontrar ao menos uma fagulha de fé, pois fé é o único verdadeiro pré-requisito para se começar a cantar o nome de Krsna.

Por muitos anos, um grupo de devotos de Krsna viajou ao redor dos Estados Unidos com dois sannyasis – Visnujana Svami e Tamal Krsna Gosvami. Visnujana Svami cantava docemente o maha-mantra Hare Krsna enquanto devotos distribuíam gratuitamente pratos de prasadam. Tamal Krsna Gosvami disse a seu amigo Ravindra Svarupa Dasa que ele deveria abordar as pessoas que estavam comendo e ouvindo e perguntar: “Você gosta da comida e da música?”. Se eles expressassem algum entusiasmo, ele deveria apresentar-lhes os livros de Prabhupada ou discutir filosofia com eles. Se eles tivessem pouca ou nenhuma atração pelo cantar e pela comida, ele não deveria investir muito tempo neles.

Em outras palavras, a fé das pessoas pode ser vista pela avidez com que buscam Krsna. Jesus fala novamente das glórias do Senhor na metáfora de uma pérola: “O reino dos céus é também semelhante a um mercador que busca pérolas preciosas, e, tendo encontrado uma de grande valor, vai, vende tudo o que tem e a compra” (Mateus 13:45). Rupa Gosvami, de forma similar, explica: “O serviço devocional puro em consciência de Krsna pode ser obtido unicamente se sendo pago um preço: intenso desejo em obtê-lo. Se tal serviço se encontra a venda em algum lugar, deve-se comprá-lo de imediato”. (Padyavali 14)

Descriminação Atenciosa

Mas a descriminação das pessoas com as quais se pretende compartilhar a verdade é algo mais complexo do que as duas opções “com fé” e “sem fé”. A verdade é que há poucas pessoas com as quais se pode compartilhar tudo ou com as quais não se pode compartilhar nada. O segredo para se evitar a ofensa de instruir um infiel, e ao mesmo tempo beneficiar a nós e aos outros, é desenvolver um sofisticado julgamento quanto à conveniência de cada caso. Krsna dá quatro diretrizes para a comunicação espiritual: a mensagem deve ser verdadeira, prazerosa, embasada na autoridade das escrituras e benéfica para ambas as partes. Para que uma mensagem seja benéfica, precisa-se determinar sua conveniência. Muitas verdades da vida espiritual, por exemplo, parecem amargas para pessoas com apegos materiais. A realização transcendental não envolve apenas a empolgante e maravilhosa revelação dos nomes, formas e atividades Krsna, senão que também inclui o conhecimento de que, enquanto separados de Krsna, estamos voluntariamente vivendo a ilusão do egoísmo e da terrível cobiça. Para progredirmos na compreensão de nossa natureza eterna, devemos encarar a desagradável realidade de que tentando desfrutar de um corpo material miserável e temporário é, no mínimo, algo um tanto constrangedor para nós almas.

Contrato Professor-Aluno

Embora a compreensão da desconfortável posição de uma alma no mundo material seja, sem dúvidas, benéfica a todos, deve ser feito uma espécie de contrato antes deste conhecimento ser fornecido. De outra forma, se o interlocutor se torna irado, não há nenhum benefício, além de poder haver prejuízo para ele e também para o transmissor da mensagem. Assim, Prabhupada diz: “Ninguém deve falar de modo que agite a mente de outros. Claro que ao falar, um professor pode instruir seus alunos dizendo-lhes a verdade, mas esse mesmo professor não precisa se dirigir àqueles que não são seus alunos com palavras que acaso venham a agitar suas mentes”. Em outras palavras, não importando quão verdadeira seja nossa instrução, a pessoa que irá nos ouvir deve, formal ou informalmente, ter nos aceitado como professores para que a instrução tenha verdadeiro benefício. Naturalmente, falar de forma agradável também é importante. Nossa apresentação deve ser civilizada e educada.

O princípio de que nossos ouvintes devem ser, de alguma forma, nossos estudantes antes que possamos falar-lhes verdades desagradáveis ou tópicos avançados continua válido quando compartilhamos a consciência de Krsna com pessoas com fé no processo. Leitores deste artigo, por exemplo, aceitaram ouvir algo de mim. Quando alguém dá uma palestra, a audiência aceita, ao menos temporariamente, a posição de alunos. O mesmo acontece quando alguém pede aconselhamento: a pessoa se aproxima de nós nos aceitando como alguma forma de autoridade, dando-nos o direito de dizer algo para o seu benefício, mesmo que possa ser algo desagradável a princípio. Sem tal contrato, formal ou presumido, nós não temos permissão de comunicar qualquer coisa em nome da verdade. Fazê-lo, no que se refere a tópicos espirituais, é ofender o nome, e se feito com um devoto de Krsna, pode também ser uma ofensa ao devoto do Senhor.

Instrução aos Gurus

Em seu livro Harinama Cintamani, Bhaktivinoda Thakura explica a ofensa de ensinar o santo nome a pessoas infiéis voltando-se especialmente aos gurus. Seja iniciando discípulos no cantar ou mantendo alguma relação formal como mestre espiritual instrutor, há, algumas vezes, a tentação de aceitar discípulos com o fim de prestígio e riqueza pessoais. Tal problema acontece em escolas comuns. Algumas universidades aceitam estudante não apenas por suas qualificações acadêmicas, mas porque eles são de famílias que levarão dinheiro e nome para a instituição. Não é nenhum segredo que mesmo as universidades mais seletivas dão preferência para tais “estudantes de sangue azul”. Eles declaram abertamente que favorecer tais estudantes abastados ajuda na redução do custo dos estudos de outros estudantes.

Talvez tal política faça sentido em termos funcionais e financeiros para um curso de engenharia ou direito, mas vai de encontro ao desejo de Krsna e a todo o humor do serviço devocional a Ele. Um guru pode ter muitos problemas se considerar a qualificação de um discípulo por algo além de sua fé.

Algumas vezes, claro, nós, seres imperfeitos, talvez sejamos enganados por alguém que demonstra falso interesse pelo serviço a Krsna. Um misericordioso devoto de Krsna deseja dar chance a todos, abanando uma pequena fagulha de curiosidade para que se torne uma fogueira de amor devocional. Se, por acaso, aceitamos um estudante ou discípulo que, posteriormente, torne-se um blasfemo, devemos publicamente renunciar tal pessoa para que nenhum de nós dois perca o abrigo do Senhor.

Se queremos que nosso cantar de Hare Krsna, Hare Krsna, Krsna Krsna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare manifeste todo o seu potencial, devemos tratar o santo nome e toda prática e conhecimento espirituais com amor e zelo. Honramos a Verdade Absoluta por darmos pouca oportunidade para que os ofensores encontrarem falhas, ensinando apenas o que vá beneficiar pessoas fiéis que aceitaram ouvir o conhecimento de nós, e sempre encontrando grande satisfação e bem-aventuranç a em compartilhar o santo nome com aqueles que anseiam conhecer seus mistérios.


por Urmila Devi Dasi (ACBSP)
Tradução por Bhagavan dasa (DvS)

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Desejo e Concentração





Cantar o nome do Senhor com plena atenção remove os obstáculos no caminho rumo ao cantar puro.

Um dia, sentei-me com um grupo de amigos e ficamos conversando sobre como foi o dia de cada um. Algumas pessoas estavam também conversando perto de nós, e um dos meus amigos pensou ter ouvido seu nome.

“Você me chamou?”, ele perguntou.

“Não, dissemos outra coisa”, eles responderam.

Desapontado, voltou para a nossa conversa.

Quando estamos em uma sala com muitas pessoas, a conversa dos outros se torna um zunido de fundo, mas se o nosso nome é pronunciado, de alguma forma nós distinguimos esse chamado e nos tornamos aptos a ouvi-lo.

Krsna também fica interessado quando nós chamamos por Ele.

“Ah, você quer falar coMigo?”, Ele pergunta.

Mas se, de fato, nós queríamos ter falado outra coisa, ou se falamos o Seu nome de qualquer jeito, Ele esperará até que realmente queiramos falar com Ele. Daí Prabhupada escrever e falar sobre cantar o mantra Hare Krsna com qualidade. Fazer o voto de cantar certo número de voltas do mantra diariamente é certamente algo válido – o simples fato de fazer tal voto demonstra sinceridade espiritual – mas a qualidade também deve estar presente. Para principiantes, cumprir nossa cota talvez já seja algo suficientemente desafiador, mas, ainda assim, devemos nos esforçar para que o cantar seja como um verdadeiro chamado pelo Senhor.

Quando cantamos com atenção e com uma postura de rendição e devoção, Krsna naturalmente reciproca nossa postura. Então, rapidamente superamos todos os demais obstáculos no cantar, na vida espiritual em geral, e na nossa meta de amor perfeito por Deus. Mas se nosso cantar for desatento, todos os obstáculos permanecerão – isso se não aumentarem.

Por que o cantar atento é o ponto chave para nos tornarmos livres de todas as outras ofensas ao nome? Quando cantamos com atenção, estamos em contato com Krsna, que irá nos mostrar, por exemplo, como nossa relação com os devotos pode estar abaixo do que Ele deseja.

A causa primária da desatenção é a distração, ou ter interesse em algo além do nome que estamos recitando. Esse interesse pode ser por riqueza, sucesso material, o sexo oposto, prestígio social, e várias outras coisas. Cantar com distração é como perguntar algo a alguém e então ficar pensando em outras coisas, ou ficar olhando pela janela, enquanto a pessoa lhe responde.

Além da distração básica, o cantar é desatento quando a pessoa é preguiçosa – uma mente lenta, assim como a mente agitada, está sempre impedindo o foco no nome. Podemos também simplesmente ser indiferentes ao nome, o que, de um ponto de vista espiritual, é loucura – como uma pessoa sã pode não dar valor ao santo nome?

Remédios Contra o Cantar Desatento

Para cantarmos com apuro e atenção, devemos primeiramente estar atentos a completar um determinado número de recitações do mantra Hare Krsna diariamente. Todo devoto iniciado na Sociedade Internacional para a Consciência de Krsna deve cantar o mantra, pelo menos, 1728 vezes ao dia (16 voltas de um cordão de 108 contas), mas principiantes podem começar com qualquer número, o importante é que o cantar seja constante. Constância, serviço regular e estável, é algo apreciado em qualquer setor da sociedade; na vida espiritual, é sinal de sinceridade e devoção pelo processo.

Para cantar plenamente concentrado, o melhor é cantar em um lugar tranqüilo. Os melhores lugares são aqueles protegidos das influências materiais. Pode-se cantar em um templo, um local sagrado dos passatempos de Krsna, ou em qualquer lugar silencioso e reservado. O movimento Hare Krsna tem muitos templos para educação e adoração pública. Na Índia, numerosos templos tradicionais são dedicados ao Senhor Krsna, muitos desses nos locais onde Ele apareceu para exibir Seus passatempos divinos. Se a deidade de Krsna e o prazer de Krsna são o centro, de fato, nossa própria casa pode ser um templo.

Também é benéfico se cantar com pessoas avançadas em conhecimento espiritual. Nossa preguiça não terá espaço se nossos amigos forem pessoas que buscam ansiosamente absorverem suas consciência no cantar, não perdendo tempo com diversões inúteis. Naturalmente, pela associação deles, também desenvolveremos um senso de urgência e determinação.

É favorável que se cante em um horário calmo (o começo da manhã é o ideal). A postura interna de se implorar pela misericórdia de Krsna é também essencial. Tais medicamentos irão rapidamente livrar-nos da insanidade de não darmos atenção ao santo nome.

O Desejo de Ter Milhões de Bocas

Para lidarmos com a raiz do problema da desatenção – interesse por algo além de Krsna e de Seu nome – é interessante tirarmos manhãs, tardes ou dias para não fazermos nada além de cantar. Se em um dia sagrado, como o Ekadasi ou o aniversário de Krsna, abstivermo-nos de comer, dormir e de outros afazes ordinários, e simplesmente cantarmos por horas a fio, sem interrupção, nossa mente irá gradualmente encontrar prazer unicamente em Krsna. Tais intensos momentos de completa absorção irão ajudar em nossa concentração durante os dias do cantar rotineiro.

Tendo superado a distração, a preguiça e a desatenção, cantaremos, como Prabhupada diz, da mesma forma que uma criança chama por sua mãe: com grande intensidade e desejo, e com a certeza de que não existe outro abrigo.

Quando o nosso cantar tiver toda a atenção de nossa mente e de nosso coração, nunca mais acharemos tal prática tediosa, nem precisaremos dedicar nossa atenção a evitar os obstáculos no caminho da perfeição - os obstáculos já estarão no encostamento, tornando nosso caminho fácil e prazeroso. Então, como o grande mestre Rupa Gosvami, diremos: “Eu não posso mensurar quanto de néctar as duas sílabas ‘Krs-na’ produzem. Quando o santo nome de Krsna é cantado, ele parece dançar sobre a língua. Passamos então a desejar ter muitas e muitas bocas. Quando o nome entra em nossos ouvidos, desejamos ter muitos milhões de ouvidos. E quando o santo nome dança no pátio do coração, ele conquista as atividades da mente, e todos os sentidos se tornam apáticos”.

(extra)

As Glórias do Cantar

“Não há nenhum voto como o voto de se cantar o santo nome, nenhum conhecimento superior, nem nenhuma meditação à altura. Esta prática traz o maior benefício. Nenhuma penitência pode se igualar ao cantar, e nada é tão poderoso quanto o santo nome”.

“Cantar é o mais piedoso dos atos piedosos, e o refúgio supremo. Nem mesmo as palavras dos Vedas são capazes de descrever a magnitude de tal processo. Cantar é o caminho mais elevado ruma à liberação, à paz e à vida eterna. É o pináculo da devoção, o prazer original do coração, e a melhor forma de se lembrar do Senhor Supremo. O santo nome apareceu para o benefício das entidades vivas. O santo nome é o senhor e mestre, o supremo objeto de adoração e o guia e mentor de toda e cada entidade viva”.

“Independente da influência de Kali-yuga, todo aquele que continuamente canta o santo nome do Senhor Krsna, mesmo enquanto dorme, pode facilmente realizar que o nome é uma manifestação direta do Senhor Krsna”.

- Srila Bhaktivinoda Thakura, Saranagati (citações do Agni Purana)


p/ Urmila Devi Dasi (ACBSP)
Tradução por Bhagavan dasa (DvS)

sábado, 8 de dezembro de 2007

Não espere pelo Papai Noel !




Você tem muito mais chance de acertar no presente se tentar alcançá-lo pessoalmente. Sonhos não duram mais que uma noite, quiçá, uma vida. Ao invés de ficar desejando coisas materiais, que são frágeis e passageiras, invista naquilo que é eterno e lhe trará paz, saúde, prosperidade, amor, fé e confiança no Senhor Supremo. Invista na sua auto-realização!
A forma humana de vida é a única que proporciona esta possibilidade, a possibilidade de transcender a matéria, de voltar ao lar original, onde há paz e felicidade eterna.
Reflita sobre a transitoriedade das coisas deste mundo, busque o conhecimento verdadeiro, procure um mestre fidedigno, renda-se a ele com humildade e vontade de alcançar a auto-realização. Então, ao perceber o seu esforço sincero, a Suprema Personalidade de Deus mostrará o caminho seguro a ser seguido, o seu maior presente !
Krishna Mayi D.D

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Conversão Harmoniosa


“Não se trata de conversão do Cristianismo para o Hinduísmo. A conversão acontece no sentido de levarmos a classe de homens ateístas a aceitarem a consciência de Deus”. (Carta de Srila Prabhupada de 26 de junho de 1976)
Em uma reunião de família, há algum tempo atrás, eu comecei a falar sobre a consciência de Krsna e seu valor em minha vida. Para minha família mais próxima – pais e irmãos – esse tipo de conversa é algo com o que já estão acostumados. Mas para parentes que vejo com menor freqüência, tal conversa os conduz a um passado longínquo, no tempo da minha “conversão”, como eles dizem.
Aparentemente, meu tio Sidney tomou como uma afronta pessoal a maior parte do que eu dizia.
“Você está tentando nos converter?”, ele disse como se há muito tempo estivesse se segurando - ele sorria, mas seus lábios estavam pálidos de raiva.
“Convertê-lo? Eu não sabia que você tinha religião”.
“Eu sou Judeu!”, ele disse incrédulo, como se aquela resposta solucionasse todas as questões. “Certo, eu não acredito em Deus, mas eu sou Judeu”.
Silêncio constrangedor.
“Bom, ao menos eu nasci Judeu, e você também”.
“Eu também nasci bebê”, eu contestei, tentando levar um pouco de humor para a discussão. “Mas isso mudou, não? Só porque você nasceu em uma religião não faz de você um praticante”.
“E...?”
“Por isso, eu falar com entusiasmo sobre a tradição religiosa que adotei, a consciência de Krsna, não desafia de forma alguma a relação que você tem com a religião de seu nascimento”.
Nós deixamos aquele assunto para lá; mas quando eu voltei para casa aquela noite, eu fiquei pensando sobre a perspectiva de meu tio. Por que ele se considera Judeu, mesmo não praticando a religião? Por que minha conversão para a consciência de Krsna era desconfortável para ele? E será que eu estava mesmo tentando convertê-lo? Como eu poderia explicar para ele que minha “conversão”, como ele via, não se tratava de um movimento horizontal do ocidente para o oriente, mas, sim, um movimento vertical, da terra firme para o caminho da transcendência?
Exclusivismo Religioso
A tensão de meu tio em relação à consciência de Krsna se baseia no exclusivismo religioso, a visão que separa as religiões de acordo com o fundador, as escrituras e as diferenças histórico-geográficas. Por causa dessas diferenças, os adeptos de algumas religiões acreditam que apenas o seu processo é efetivo, com todos os outros apresentando algum grau de debilidade. Assim, muitas religiões, especialmente aqueles originadas no ocidente, têm enraizadas a noção de serem a religião verdadeira. Acreditam que apenas eles estão trilhando o exclusivo caminho para Deus e a salvação.
Mas o mundo moderno vem refutando tal visão. Pela primeira vez na história registrada, estamos nos tornando rapidamente uma comunidade global, o que naturalmente nos conduz ao pluralismo religioso – compreensão verdadeira das religiões de nossos vizinhos e como elas se relacionam com nossa gama pessoal de crenças.
A visão pluralista se torna algo mais logicamente plausível quando reconhecemos que todas as tradições religiosas genuínas acreditam em uma verdade transcendental (frequentemente chamada de Deus) e em nossa obrigação de agirmos em harmonia com essa verdade.
Mas o exclusivismo persiste. De onde ele vem? Qual sua origem? Psicologicamente, sua origem pode ser facilmente traçada a partir do desejo de ser considerado especial dentro do cosmo, a necessidade de se situar em algo exclusivo.
Em relação às religiões originadas no Oriente Médio, acadêmicos atribuem a idéia do exclusivismo como originada no exílio dos Judeus para a Babilônia, quando se voltaram pela primeira vez ao monoteísmo e desenvolveram a tradição de não se misturarem a outras nações. Mas não diga isso ao meu tio. As leis Mosaicas são vistas como a única revelação, e associam os Judeus a Deus de forma que nenhuma outra pessoa teria relação com Ele. Isso faz deles “o povo escolhido”. A crença dos Judeus em um “Deus exclusivo” se estendeu a seu pupilo, o cristianismo, com o “Jesus é o único filho de Deus”. Tendo nascido do fértil solo exclusivista do Judaísmo, a tradição cristã clama que só se pode alcançar o Supremo através de Jesus, crença que inspira as atividades missionárias da igreja por todo o mundo.
Mas se pensarmos sobre isso profundamente, realizaremos que todos somos partes do mesmo organismo – Deus – e nossa exclusividade se baseia exatamente em como, de acordo com nossa maquiagem psicológica individual, iremos servir a Ele para que desenvolvamos nosso amor por Ele. Como criaturas finitas, quem somos nós para limitarmos o amor de Deus, dizendo que Ele aceita o amor daqueles em um processo e não aceita o daqueles em outro? Movimentos Judeus que realizaram esse ponto assumiram a postura pioneira de reconhecerem a legitimidade de outros caminhos para se chegar a Deus, e o Conselho do Vaticano de 1965 diz que os Cristãos devem buscar apreciar o que há de bom e verdadeiro nas demais fés.
Isso não tem por fim dizer que as diferenças entres as tradições religiosas são meramente semânticas, ou que todos os caminhos são igualmente efetivos em conduzir-nos para o destino supremo. No movimento Hare Krsna, balanceamos nossa abertura às várias tradições religiosas do mundo com afiados questionamentos acerca do conteúdo de determinadas tradições. É preciso haver um critério base para se discernir verdades religiosas, mesmo que todas as principais tradições sejam aceitas em essência.
O que É Religião?
Em uma palestra pública no ano de 1972, Srila Prabhupada, de forma muito sensata, define a natureza da religião verdadeira:
“Na sociedade humana, há sempre algum tipo de instituição religiosa. Isso se chama dharma, fé. Como já foi explicado, dharma é o dever constitucional e funcional de cada indivíduo. A essência da verdadeira religião é a prestação de serviço a Deus. Nós, todavia, manufaturamos diferentes religiões na sociedade de acordo com o país ou as circunstâncias. [...] Pode-se praticar qualquer tipo de princípio religioso, mas o resultado deve ser a aquisição da perfeição. Talvez uma pessoa diga que está seguindo perfeitamente os princípios de sua religião, que são trazidos na Bíblia, no Corão, etc., e isso é muito bom, mas qual é o resultado? O resultado deve ser que a pessoa deseje cada vez mais ouvir sobre Deus”.
Enquanto conversava com meu tio Sidney, tais idéias norteavam meus pensamentos. Estando ciente de sua descendência Judaica (e da minha também), eu tentava trazer algo mais profundo. Eu estava falando sobre a prática de princípios espirituais. Eu não estava nem um pouco preocupado se chamamos tais princípios de Judaísmo, Cristianismo ou Hinduísmo. No ensinamento de Prabhupada, chamado de Vaisnavismo, essa essência espiritual se chama sanatana-dharma, ou a “eterna função da alma”. Essa tradição incentiva seus adeptos a se focarem no cerne da busca religiosa: amor por Deus. Ela enfatiza a qualidade da devoção, e não o rótulo de um caminho particular, como disse Prabhupada em uma conversa em Gênova em junho de 1974:
“Primeiramente, o que é qualidade? A qualidade do cristão é percebida por sua obediência ou não dos Dez Mandamentos. Se ele não os cumpre, onde está sua Cristandade? Assim é declarado guna-karma: pela qualidade e trabalho a pessoa se torna Cristã, Hindu ou Muçulmana. É preciso que exista a qualidade. E quando a espiritualidade se desenvolve, seja através do Cristianismo, do Hinduísmo ou do Islamismo – isso não importa – aí está a qualidade desejada... Portanto, nosso movimento existe para criar pessoas que amam a Deus, e isso é declarado no Bhagavatam: a religião de primeira classe é aquele que transforma seus seguidores em pessoas que amam a Deus”.
De acordo com Prabhupada, o caminho supremo é aquele que nos permite desenvolvermos amor por Deus. Se a pessoa não desenvolve esse amor, então a instituição religiosa não é nada senão uma distração à meta última da vida. Prabhupada baseia essa idéia no verso 1.2.6 do Srimad-Bhagavatam, possivelmente a mais profunda de todas as escrituras religiosas: “O dever supremo (dharma) de toda a humanidade é aquele pelo qual as pessoas podem obter o serviço devocional amoroso ao Senhor transcendental. Tal serviço devocional deve ser desmotivado e ininterrupto para a completa satisfação do Eu”.
Em outras palavras, há o que se chamaria de dharma externo (dever, religiosidade) e de dharma interno, e se o primeiro não conduz ao segundo, o primeiro deve ser descartado. Isso pode ser entendido pelo cuidadoso estudo do Bhagavad-gita: Krsna inicialmente instrui a humanidade a aceitar completamente o dharma. Ele diz que é com o objetivo de se estabelecer o dharma que Ele pessoalmente descende (Bg. 4.8) – mas, até então, Krsna se refere ao dharma externo. Quando o Gita começa a se aproximar de seu fim, Krsna finalmente sugere que abandonemos o dharma externo e tomemos refúgio nEle. (Bg. 18.66) Esse é o dharma interno. Como exemplifica o comportamento do meu tio, enquanto se calcula como praticar sua religião é muito freqüente deixar Deus de fora da equação. Assim, o Senhor Krsna diz de forma definitiva que seguir as tradições religiosas é importante, mas que o mais importante é se ater à essência da religião.
O que É, Definitivamente, Dharma?
O movimento Hare Krsna respeita e pratica o dharma como ele é enunciado nos antigos textos Védicos, mas enfatizamos a essência do dharma: amor por Deus. Em última instância, é isso que todas as religiões ensinam – adesão ao dharma externo mas com a consciência de esse é mero subserviente do dharma interno. Tal percepção deve ser adquirida para a compreensão do verdadeiro significado da busca religiosa.
Em Sânscrito, a palavra mais frequentemente usada para designar religião é, mais uma vez, dharma. Todavia, dharma denota mais do que uma doutrina que alguém se afilia para a expressão de determinada fé religiosa. Dentre suas diversas definições, dharma literalmente significa “a essência de uma coisa”. O dharma do açúcar é a doçura; o dharma do fogo é o calor; o dharma das entidades vivas é conhecer e amar a Deus. Em outras palavras, dharma é aquilo do qual um ser ou coisa não pode ser separado. Você pode mudar sua fé, a forma com que expressa sua religiosidade – um Judeu pode se tornar Muçulmano, que pode se tornar Cristão, que pode se tornar Hindu – mas você é sempre servo de Deus. Esse é seu verdadeiro dharma.
Talvez alguém proteste: “Eu não sou servo de Deus. Eu sou dono de mim mesmo. Eu não sirvo ninguém”. Se examinarmos cuidadosamente nossa vida, todavia, veremos claramente que somos sempre servos. Podemos servir Deus e, por extensão, a humanidade ou podemos servir nossa família ou nossos sentidos pessoais – mas somos servos por natureza. No estado condicionado da existência material, as entidades vivas servem o Senhor de forma indireta e desfavorável, enquanto que no estado liberado as entidades vivas servem o Senhor de forma direta e favorável.
Para exemplificar, todos no Estado servem o Estado. Alguns servem de forma direta e favorável, como os policiais, soldados, políticos, os cidadãos que pagam seus impostos etc., enquanto que outros servem de forma indireta e desfavorável, como os prisioneiros. Presos na prisão da natureza material, sob a supervisão de Durgadevi (a personificação da energia material), as almas condicionadas são forçadas a servir maya, ou ilusão, e, em troca de seus serviços prestados, elas são às vezes chutadas pelas cruéis leis da natureza e às vezes afagadas pelo seu carinho inconstante. As almas liberadas, que vivem na morada suprema do Senhor (o reino de Deus, nosso lar original), em contraponto, servem o Senhor diretamente em diversas variedades de rasas espirituais, ou relacionamentos transcendentais, e desfrutam de uma vida eterna, plena de conhecimento e de bem-aventurança na companhia da Suprema Personalidade de Deus, o reservatório de todo o prazer.
A Importância do Não-Sectarismo
Uma vez que Deus é um, a religião também deve ser uma. Essa religião comum, que recebe diversos nomes, é conhecida pelos indianos (e pelos devotos Hare Krsna) como sanatana-dharma, e é isso que eles se esforçam em praticar. Assim, sanatana-dharma, a religião do movimento Hare Krsna, não é um conceito sectário que tenta artificialmente rebaixar outras religiões e estabelecer sua supremacia com base nos conceitos mundanos de superioridade e inferioridade; senão que é a natural busca da alma espiritual pelo serviço e amor a Deus. É a essência – o dharma interno – de toda entidade viva.
O movimento Hare Krsna prega que as entidades vivas não são Cristãs, Judias, Hindus ou Muçulmanas, porque esses títulos são designações corpóreas. E, se isso estivesse claro na conversa que tive com meu tio, não teria havido nenhum desentendimento. As pessoas não são o corpo, mas sim a alma espiritual. Contudo, muitos acham que são cristãos, por exemplo, simplesmente porque nasceram em uma família cristã. Eles não consideram que na próxima vida – ou mais tarde na mesma – podem se tornar Budistas, Siques ou adeptos de qualquer outra religião. Novamente, um Cristão pode se converter em Judeu, ou um Hindu em Muçulmano – são todas designações temporárias do corpo e de crenças pessoais, designações que mudam, que têm começo e fim. Portanto, não são sanatana-dharma, a verdadeira religião eterna de todos.
Mas se uma pessoa encontra os princípios do sanatana-dharma nos ensinamentos do Cristianismo, do Islamismo, ou em qualquer outro lugar, ela deve aceitá-los sem considerar o rótulo ou o local de origem. Enfim, a religião Hare Krsna ensina o verdadeiro não-sectarismo, como estabelecido anteriormente, encorajando que as pessoas aceitem qualquer processo genuíno que as conecte com Deus, como afirma Prabhupada:
“Pode-se compreender nossa relação com Deus através de qualquer processo – através do Cristianismo, através da literatura Védica, ou através do Corão – mas tal assunto deve ser compreendido. O propósito deste movimento da consciência de Krsna não é transformar Cristãos em Hindus ou Hindus em Cristãos, mas informar a todos que o dever do ser humano é entender sua relação com Deus”.
A compreensão da existência de um dharma eterno, uma religião universal, é tão clara para Prabhupada que o conceito de sectarismo lhe parece absurdo:
“O que é sectarismo? Em todas as seitas a criança é dependente dos pais. O que se quer dizer com sectarismo? Quer-se dizer que a criança Hindu não é dependente de seus pais? A criança muçulmana não depende de seus pais? Todos dependem dos pais. Se ela é uma criança Hindu, uma criança Cristã ou uma criança Muçulmana, isso não importa. Essa é a natureza da criança. De forma similar, talvez você seja Hindu ou Muçulmano, mas você depende de Deus. Isso é um fato. Então, onde está o sectarismo? O Muçulmano pode dizer ‘Não, não. Não somos dependentes de Deus’? Os Cristãos podem declarar isso? Temos que pegar a condição geral: todos são dependentes de Deus. Onde está a questão do sectarismo? É como uma nuvem: todos estão esperando por chuva. Isso não significa que se espere por chuva Muçulmana ou chuva Hindu ou chuva Cristã. Toda chuva é dependente das nuvens. Isso é tudo. Hindu, Muçulmano, Cristão – não somos dependentes da nuvem. Por que declarar-se independente de Deus?”.
Prabhupada grifou a importância de se buscar a verdadeira religião em qualquer lugar que se possa encontrá-la, embora ele claramente expressasse sua fé pessoal na tradição Védica, a qual atribuía os predicados de “a mais abrangente e clara” e “os mais antigos textos conhecidos pela humanidade”:
“Se uma pessoa é séria quanto a buscar por Deus, ela não deve pensar ‘eu sou Cristã’, ‘eu sou Hindu’ ou ‘eu sou Muçulmana’. [Senão que] deve considerar qual processo é o mais prático. Não deve pensar: ‘Por que eu deveria seguir o Hinduísmo e as escrituras Védicas?’. O propósito de se seguir as escrituras Védicas é desenvolver amor por Deus. Quando estudantes vêem para a América em busca de educação superior, eles não se preocupam se os professores serão americanos, alemães ou de outra nacionalidade. Se querem educação superior, simplesmente vêem para a América. De forma similar, se há um processo efetivo para se compreender e se aproximar de Deus, como esse processo da consciência de Krsna, deve-se tirar o máximo de proveito”.
Converter em Quê?
Citações como a acima pedem reflexão: Prabhupada está recomendando alguma espécie de conversão? Ele vê sua tradição como sendo melhor do que outras?
Se pegarmos essa última citação juntamente com as demais, veremos que Prabhupada não está recomendando que pulemos de uma religião para a outra, mas que olhemos a fundo a verdade religiosa e vivamos nossas vidas de acordo. Claramente ele vê a tradição Vaisnava como mais inclusiva, e as escrituras Védicas como mais claras e objetivas; e ele certamente iria recomendar a uma pessoa – se se demonstrasse inclinada – a aceitar essas escrituras e tradição. Mas para que fim? Esse é o ponto crucial. Não é para aumentar o número de Hinduístas ou de adeptos de qualquer outra seita. Prabhupada está apenas pedindo para que as pessoas procurem um processo científico que culmine no amor por Deus. Se podem fazer isso através de alguma tradição sectarista, então que façam; mas ele recomenda o Vaisnavismo pois sabe que ele funciona.
Prabhupada diz:
“Sim, eu não digo que Cristãos devam se tornar Hindus. Eu apenas digo: ‘Por favor, obedeçam aos mandamentos”. Eu quero fazer dos Cristãos melhores Cristãos. Essa é minha missão. Eu não digo: “Deus não está na sua tradição; Deus está apenas na nossa”. Eu simplesmente digo: “Obedeça a Deus”. Eu não digo: “Você tem que aceitar que o único nome de Deus é Krsna”. Não, eu digo: “Por favor, obedeça a Deus. Por favor, tente amar a Deus”.
Assim, se os ensinamentos de Prabhupada falam sobre algum tipo de conversão, falam sobre converter pessoas do materialismo para o espiritualismo – e isso é tudo. Sua preocupação é que as pessoas pratiquem suas religiões de forma sincera e com entusiasmo. E como ele era pessoalmente praticante do dharma Vaisnava, ele estava confiante de que poderia ensinar a outros a fazerem o mesmo. Prabhupada não aceita as idéias de uma revelação exclusiva, de um povo escolhido, ou de um único salvador; por isso não pensa em termos de conversão. Ao contrário, afirma que Deus aparece em várias formas, tempos e locais para falar a língua da religião para todas as culturas e, assim, estabelecer os vários aspectos de Sua lei e de Seu amor. De acordo com Prabhupada, o amor de Deus pela humanidade é algo muito poderoso para ser restrito a um tempo, local ou cultura. Mesmo destacando o prestígio da tradição Vaisnava, os ensinamentos de Prabhupada são não-sectários. Ele não estava interessado em conversões, embora estivesse interessado em compartilhar a ciência Vaisnava de como desenvolver amor por Deus. Só desejo que meu tio Sidney possa entender isso.

p/ Satyaraja Dasa
Tradução por Bhagavan dasa (DvS)