A ciência moderna dispõe de todo conhecimento necessário para eliminar a maioria das enfermidades, combater a pobreza e a inanição e gerar abundância de energia segura e renovável. Contamos com recursos e mão-de-obra suficientes para realizar os mais desvairados sonhos da humanidade.
Contudo, mesmo com todo esse progresso, estamos cada vez mais longe de um futuro feliz, livre de sofrimentos. Os mais importantes triunfos tecnológicos- a energia atômica-, a cibernética, a química e a bacteriologia – voltaram-se para propósitos belicosos, criando um poder destrutivo inimaginável. Centenas de milhões de pessoas morrem de fome e de doenças, que poderiam ser remediadas pelos bilhões de dólares gastos anualmente na loucura da corrida armamentista. Além disso, vários cenários plausíveis de hecatombe global, da gradual destruição ambiental de vários tipos à devastação repentina e imediata pelo holocausto nuclear, deixa-nos com o dúbio privilégio de sermos a primeira espécie da história do planeta a desenvolver o potencial para cometer suicídio coletivo e, o que é pior, destruir com esse ato todas as outras formas de vida.
Diante dessa perigosa situação, é vital identificarmos as raízes da crise global e desenvolvermos remédios eficazes para aliviá-la. A maioria das atuais abordagens dos governos e de outras instituições tem como foco medidas militares, políticas, administrativas, legais e econômicas que refletem as mesmas estratégias e atitudes que criaram a crise, atacando antes os sintomas do que as causas e, por essa razão, produzem, quando o conseguem, resultados limitados.
Se temos os meios e o conhecimento tecnológico para alimentar a população do planeta, garantir a todos um padrão de vida razoável, combater a maioria das enfermidades, reorientar as indústrias para fontes de energia inesgotável e evitar a poluição, o que nos impede de dar esses passos positivos?
A resposta está no fato de todas as situações difíceis acima mencionadas serem sintomas de uma única crise fundamental: os problemas que enfrentamos não são, em última análise, apenas econômicos, políticos e tecnológicos. Eles são reflexos do estado emocional, moral e espiritual da humanidade contemporânea. Dentre os aspectos mais destruidores da psique humana, estão a agressão mal-intencionada e o consumismo insaciável. Trata-se de forças responsáveis pelo desperdício inimaginável da beligerância moderna. Elas também impedem uma divisão mais adequada dos recursos entre pessoas, classes e nações, bem como a reorientação para prioridades ecológicas essenciais à continuidade da vida neste planeta. Esses elementos destruidores e autodestrutivos na atual condição humana são uma conseqüência direta da alienação da humanidade moderna tanto de si mesma como da vida e dos valores espirituais.
Em vista desses fatos, um dos poucos movimentos encorajadores e auspiciosos do mundo de hoje é o renascimento do interesse pelas antigas tradições espirituais e pela busca mística. Pessoas que passaram por intensas experiências de transformação e conseguiram aplicá-las à sua vida cotidiana exibem mudanças muito nítidas em seus valores. Esse resultado encerra uma grande promessa para o futuro do mundo, uma vez que representa um movimento que se desvia das características destruidoras e autodestrutivas da personalidade, bem como o surgimento de características que promovem a sobrevivência individual e coletiva.
As pessoas envolvidas nos processos de emergência espiritual tendem a desenvolver uma nova apreciação de todas as formas de vida, bem como reverência por elas, ao lado de uma nova compreensão da unidade de todas as coisas, o que costuma levar a intensas preocupações ecológicas e a uma maior tolerância diante dos outros seres humanos. A consideração por toda a humanidade, a compaixão por todos os elementos da vida e o pensamento em termos do planeta como um todo passam a ter prioridade diante dos interesses estreitos das pessoas, das famílias, dos partidos políticos, das classes, das nações, e dos credos. Aquilo que nos une mutuamente e aquilo que temos em comum se torna mais importante do que as nossas diferenças, vistas antes como fator de aperfeiçoamento do que como ameaças. Podemos ver, nas atitudes típicas da emergência espiritual, o contraponto da intolerância, da irreverência para com a vida e da falência moral – raízes da crise global. Dessa maneira é nossa esperança que o crescente interesse pela espiritualidade e a grande incidência de experiências místicas espontâneas sejam o arauto da mudança da consciência da humanidade numa direção que vai ajudar a reverter o nosso atual curso de autodestruição.
Vimos que pessoas que passam por emergências espirituais obtêm enormes benefícios de abordagens que apóiam o potencial transformador desses estados. Essas novas estratégias também podem ter efeitos muito benéficos no ambiente humano imediato dessas pessoas – a família, os amigos, e os conhecidos. É estimulante considerar que essas atividade pode , além disso, ter relevância para a sociedade humana como um todo, ajudando a minorar a crise por que todos passam.
Stanislav Grof e Christina Grof
quarta-feira, 23 de maio de 2007
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